Escola de samba desfilará com a ‘bênção’ da igreja
Unidos de Vila Maria citará Nossa Senhora Aparecida com aval da arquidiocese de SP
Se um bom samba é uma forma de oração, como dizia Vinicius de Moraes, a Unidos de Vila Maria resolveu seguir o conselho do poeta.
A escola do Grupo Especial de SP ganhou a “bênção” da Igreja Católica para ir à avenida com um enredo sobre Nossa Senhora Aparecida, em homenagem aos 300 anos da descoberta da imagem da santa nas águas do rio Paraíba.
Em ação inédita, a pedido da escola, a Arquidiocese de São Paulo acompanhou a criação do samba-enredo e dos figurinos, com três condições: proibiu nudez ou sensualidade, referências ao sincretismo religioso e a reprodução fiel da imagem da santa. “Vai ser lindo e respeitoso”, diz o carnavalesco Sidnei França.
O padre e cantor Reginaldo Manzotti interpreta o trecho inicial do samba oficial —reprodução da música “Nossa Senhora”, de Roberto Carlos.
“O samba-enredo é uma oração. Não dá para tirar uma palavra. Chorei quando ouvi”, disse ele à Folha. “Abracei o carnavalesco e perguntei: ‘Você já pensou em virar padre?’”
Na verdade, a igreja fez uma pequena alteração na letra do samba: trocou a palavra “adorar” por “venerar”. “Adorar é só para Deus”, diz o secretário de comunicação da Arqui- diocese, Rafael Alberto.
Também não passaram incólumes os figurinos das musas da escola. A maioria dos ajustes foi no comprimento. “É natural. Na referência de Carnaval delas, elas já estavam supercomportadas”, diz.
A maioria das musas entendeu e apoiou a mudança, afirma França, que conta que a supervisão da igreja foi “tranquila e sem sobressaltos”. “[A roupa] é sensual, mas sem vulgaridade”, declarou a madrinha de bateria —e ex-panicat— Dani Bolina.
Neste ano, a escola não terá rainha. “A única rainha é Nossa Senhora”, diz França.
Antes ou depois de cada ensaio, os integrantes da escola rezam uma Ave Maria. O barracão ganhou uma réplica de Nossa Senhora.
Grupos católicos reagiram ao apoio da igreja ao samba, e fizeram um abaixo-assinado pela internet para protestar contra “a depravação total” e a “ofensa à honra da mãe de Deus”. “São reações isoladas”, diz Manzotti.
Para o arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, “a intenção é boa e a forma também”. “Será que Maria não gostaria de chegar lá, onde mais se faz necessária a sua presença? Não foi para os pecadores que Jesus veio ao mundo?”, escreveu o cardeal, no semanário oficial da arquidiocese.