Folha de S.Paulo

Com alta procura, Uruguai freia pedidos de residência permanente

Após conceder 8.000 autorizaçõ­es em 2016, governo diz não estar preparado para atender demanda

- ARGENTINA SYLVIA COLOMBO

Área: 176.215 km² (pouco menor que PR) População: 3.444.071 (pouco menor que RN) Imigrantes: 2,4% (2011) IDH: 0,793 (52º; Brasil é 75º) PIB: US$ 58,15 bilhões (77º; Brasil é 9º) Cresciment­o: 0,1% (2016)* Desemprego: 7,74% (dez.16) Inflação: 8,27% (jan.17)

“O Uruguai é igual, mas um pouco diferente”, diz o argentino Nicolás Ortíz, 34, vendedor de uma livraria na rua Tristán Narvaja, em Montevidéu, conhecida por misturar sebos com lojas de livros novos. Ortíz estudava literatura na Universida­de de Buenos Aires quando, em 2001, a economia colapsou após a queda de Fernando de la Rúa (1999-2001). Então, foi para Montevidéu com a mãe, funcionári­a de uma empresa que faliu à época.

A frase que abre a conversa não é original; Ortíz adaptou-a de um poema de Jorge Luis Borges (“Milonga para los Orientales”, 1965), célebre autor argentino que, em vários de seus escritos, elogiava o Uruguai (chamado historicam­ente de Banda Oriental) pelas mesmas razões que os argentinos radicados de hoje apontam: é um país mais calmo, mais estável, e Montevidéu é, em muitas coisas, parecida com Buenos Aires.

A vocação de receber gente do mundo inteiro vem aumentando nos últimos anos. No entanto, autoridade­s uruguaias declararam, no começo deste ano, que não estão preparadas para tramitar os papéis dos que vêm pedindo residência.

Em comunicado no começo de fevereiro, a chancelari­a do país afirmou que não há vagas para o procedimen­to até janeiro de 2018, nem mesmo para cidadãos do Mercosul —que, de acordo com o tratado, teriam mais facilidade para se instalar nos outros países-membros.

“O aumento de pedidos está seguindo uma escala pouco antes vista, mas isso deveria ser visto como uma coisa boa para o Uruguai, que é um país pouco povoado. O governo parece temer não dar conta de atender a todos”, diz à Folha a presidente da ONG Idas y Vueltas, a holandesa Rinche Roodenburg, que dá assistênci­a a imigrantes em situação de pobreza.

A quantidade de residência­s concedidas pelo governo uruguaio passou de 613 em 2014 para 6.919, em 2015, e 8.098 em 2016. Apenas em janeiro de 2017, foram 305. Foi então que as autoridade­s resolveram colocar um freio.

A interrupçã­o não vale, porém, para pedidos de asilo político a refugiados de países em guerra ou grave situação humanitári­a.

Entre os que conseguira­m a documentaç­ão para residência permanente no ano passado, 42% são argentinos; 18%, brasileiro­s; 13%, venezuelan­os; e 8%, peruanos.

O status dá direito a uma cédula de identidade com a qual é possível trabalhar, alugar imóvel, pedir vaga numa universida­de e ser atendido em hospitais públicos.

Ainda não está completame­nte regulada a Lei da Maconha, mas, quando isso ocorrer, detentores do documento poderão se inscrever no programa e se candidatar ao processo para comprar as quantidade­s permitidas.

“A maior prova de que não é um problema que mais pessoas venham é que em pouco tempo vejo todos com trabalho. Se o Estado põe esse freio é porque responde a certo preconceit­o da sociedade, principalm­ente com relação a países como República Dominicana, Haiti e Cuba. Dizendo mais claramente, àqueles que trazem população negra”, diz Roodenburg.

Para esses três países, de fato, a exigência é maior —é necessário, por exemplo, carta-convite, que muitas vezes é exigida por terceiros. BRASIL Almeida, 46, conta que está no Uruguai há 18 anos. A princípio, veio temporaria­mente, numa época de crise, mas logo achou o ambiente amigável.

Ela casou-se com um local, tem filhos uruguaios e continua trabalhand­o em sua profissão original, a de assistente social.

“As coisas se encaixaram porque logo vieram os governos progressis­tas [da esquerdist­a Frente Ampla] e, portanto, minha expertise era necessária na aplicação dos programas.”

Ela diz que pôde manter o padrão de vida que tinha no Brasil, e hoje vive na região de Pocitos, um dos bairros de classe média alta da cidade, diante do rio da Prata.

“Eu admiro muito a cultura, mesmo das pessoas mais simples. Aqui no Uruguai todo mundo sabe ler, escrever, conhece bastante história. No Brasil, chega a dar tristeza a ignorância de quem é mais humilde.”

interrupçã­o de trâmites e diz haver oportunida­de a todos que chegam

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