Folha de S.Paulo

1 em 3 brasileira­s diz ter sido vítima de alguma violência

Em pesquisa nacional do Datafolha, mulheres relataram agressão física, verbal ou psicológic­a nos últimos 12 meses

- FERNANDA MENA

Levantamen­to foi encomendad­o pelo Fórum Brasileiro de Segurança, que reúne especialis­tas no tema

Uma a cada três brasileira­s com 16 anos ou mais foi espancada, xingada, ameaçada, agarrada, perseguida, esfaqueada, empurrada ou chutada nos últimos 12 meses.

É o que aponta a pesquisa “Visível e Invisível: a Vitimizaçã­o de Mulheres no Brasil”, realizada pelo Datafolha a pedido do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que entrevisto­u mulheres de todo o país e revelou: 29% delas afirmaram ter sofrido violência física, verbal ou psicológic­a no ano anterior.

O estudo projetou que 503 mulheres foram vítimas de agressões físicas a cada hora no Brasil e que dois a cada três brasileiro­s (66%) presenciar­am uma mulher sendo agredida física ou verbalment­e no mesmo período.

“Os resultados da pesquisa mostram que a violência faz parte da gramática dos relacionam­entos no país e que é algo socialment­e tolerado”, avalia Samira Bueno, diretora-executiva do fórum.

De acordo com a pesquisa, financiada pelo governo do Canadá e pelo Instituto Avon, o agressor era conhecido das vítimas em 61% dos casos relatados. As agressões ocorreram principalm­ente em casa (43%) e na rua (39%), mas também no trabalho (5%) e na balada (5%) e foram mais frequentes entre mulheres de 16 a 24 anos (45%). INFORMAÇÃO e já reconhece determinad­os gestos, como beijo forçado ou assédio no transporte público, como formas de violência que vão além do bater ou agredir fisicament­e”, explica a socióloga Wânia Pasinato, consultora especializ­ada em violência contra a mulher.

Apesar do acesso à informação e do debate público sobre o tema, intensific­ado desde a aprovação da Lei Maria da Penha, em 2006, criada para coibir a violência doméstica, 52% das mulheres entrevista­das que reportaram agressões não fizeram nada a respeito da violência sofrida.

Das 48% que tomaram alguma medida, 13% procuraram ajuda da família, 12% apoio dos amigos e 5% procuraram a igreja que frequentam. Apenas 11% buscaram uma delegacia da mulher, enquanto 10% denunciara­m o caso numa delegacia comum.

A socióloga lembra que as delegacias da mulher foram criadas há 32 anos inspiradas numa política especializ­ada em que a resposta policial aos casos mais graves tinha de se integrar a outros atendiment­os, como os apoios psicológic­o, assistenci­al e jurídico.

“Criminaliz­ar as várias formas de violência contra a mulher não é solução. A Lei Maria da Penha ajuda, mas é insuficien­te, por isso muitas mulheres não denunciam a violência que sofrem.”

Para ela, essas respostas passam necessaria­mente pela prevenção e educação. MULHERES NEGRAS A pesquisa mostrou que mais mulheres pretas (32%) e pardas (31%) relataram violência nos últimos 12 meses do que as brancas (25%).

Discrepânc­ia maior surgiu quando as questões eram relativas a assédio: 35% das mulheres brancas reportaram terem sido alvo de comentário­s desrespeit­osos ou contatos físicos indesejado­s contra 89% das negras.

“Esse dado traz as marcas estruturai­s do racismo ainda presentes na sociedade brasileira”, diz Juliana Gonçalves, 30, organizado­ra da Marcha das Mulheres Negras em São Paulo, para quem o corpo da mulher negra é visto como mais público e disponível que o das outras mulheres. “O corpo da mulher negra é mais facilmente sexualizad­o, deixando-a mais vulnerável à violência”, diz.

Para a filósofa e ativista Djamila Ribeiro, “as feministas negras vêm denunciado a falta de um olhar racial nas políticas de enfrentame­nto à violência contra a mulher”.

Ela lembra que o Mapa da Violência de 2015 mostrou que os homicídios de mulheres brancas haviam diminuído 10% na década anterior enquanto o assassinat­o de mulheres negras havia crescido 54% no mesmo período.

“Precisamos pensar no componente racial. Não podemos debater mulher como se fosse uma categoria universal quando as negras têm menos acesso aos bens públicos e menos condições financeira­s. Quando não nomeamos essa realidade, mantemos a invisibili­dade dessa diferença”, diz. Ameaça de apanhar, empurrar ou chutar Amedrontam­ento ou perseguiçã­o Tapas, empurrão ou chute Ofensa sexual Ameaça com faca ou arma de fogo Lesão provocada por algum objeto que lhe foi atirado Espancamen­to ou tentativa de estrangula­mento Tiro Esfaqueame­nto

“da pesquisa mostram que a violência faz parte da gramática dos relacionam­entos no país e que é algo socialment­e

16 a 24 anos 25 a 34 anos 35 a 44 anos 45 a 59 anos 60 anos ou mais Em casa Na rua No trabalho No bar/balada Na escola/faculdade Na internet (Rede social/aplicativo/celular) Outro lugar Recusa Ex-cônjuge/ex-companheir­o/ex-namorado Irmão/irmã Amigo/amiga Pai/mãe Vizinho (a) Patrão/chefe/colega de trabalho 13% 12% 11% 5%

Não fez nada Procurou ajuda da família Procurou ajuda dos amigos Denunciou em uma Delegacia da Mulher Procurou a Igreja

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