Folha de S.Paulo

Novos voos

Na privatizaç­ão de quatro aeroportos, melhor notícia é o abandono do modelo que unia empreiteir­as, bancos oficiais e fundos de pensão

-

Pode-se considerar positivo o resultado do leilão de quatro aeroportos federais nesta quinta (16). Foi a primeira rodada de privatizaç­ões do setor de infraestru­tura na gestão de Michel Temer (PMDB) —e depois da Lava Jato.

Ao conceder à iniciativa privada a exploração dos terminais de Porto Alegre, Salvador, Florianópo­lis e Fortaleza, o governo receberá à vista R$ 1,5 bilhão, mais de 90% acima do preço mínimo estipulado. A arrecadaçã­o ao longo dos 30 anos dos contratos chegará a R$ 3,7 bilhões.

Trata-se de um alívio para a equipe de Temer, que receava um fracasso por falta de interessad­os. A despeito do número menor de concorrent­es no certame —apenas três empresas, contra 11 grupos em 2012 e cinco em 2014—, os preços elevaram-se em todas as disputas.

Esperam-se dos concession­ários investimen­tos de R$ 6,6 bilhões. Conforme nova cláusula dos contratos, destinada a reduzir incertezas no negócio, o volume dos aportes dependerá de condições como o nível de demanda dos usuários. Do total de passageiro­s do país, 59% serão atendidos por aeroportos em regime de concessão —12% nos terminais recém-privatizad­os.

O perfil das empresas vencedoras indica nova etapa no setor. São todas operadoras reconhecid­as (a francesa Vinci, a alemã Fraport e a suíça Zürich), que entraram sozinhas na empreitada.

A ausência da estatal Infraero e de empreiteir­as marca mudança fundamenta­l em relação aos leilões realizados na gestão de Dilma Rousseff (PT). Desmobiliz­a-se o modelo que associava políticos, grandes construtor­as, bancos federais e fundos de pensão em torno dos grandes projetos.

A demonstraç­ão de que o país pode atrair investimen­tos em moldes de mercado e sem financiame­nto oficial é a notícia mais importante a ser comemorada.

Deve-se conter os ânimos, porém, diante da dimensão dos desafios envolvidos na infraestru­tura nacional. Se a regulament­ação do setor aeroportuá­rio está mais bem resolvida, o mesmo não se pode dizer, por exemplo, de ferrovias, mobilidade urbana e saneamento.

Permanecem as dificuldad­es de sempre —má qualidade dos projetos, imprevisib­ilidade no licenciame­nto ambiental, confusão de jurisdição dos vários órgãos de controle, riscos de judicializ­ação.

São vícios resultante­s de anos de intervençã­o caótica do Estado, seja por descrença nos mecanismos de mercado, seja por associação indevida entre políticas públicas e negócios privados.

Nesse sentido, parece promissora a entrada de participan­tes não comprometi­dos com as deletérias práticas anteriores.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil