Folha de S.Paulo

Educação e violência

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O carro se aproxima lentamente, percorrend­o as ruas sujas de lama de uma comunidade de São Luís, o Coroadinho. Explicam-me que se trata de uma área conflagrad­a, onde a violência faz parte do cenário cotidiano. Conheci várias favelas e bairros em diversas partes do mundo com caracterís­ticas semelhante­s. Em muitos deles, o prédio de uma escola se destacava.

O que encontrei lá, no entanto, não se assemelha ao que se costuma ver nestas áreas. Ali se ergue uma escola em tempo integral com jovens comprometi­dos com seus sonhos de futuro, professore­s aparenteme­nte acreditand­o no potencial dos alunos e uma proposta pedagógica exigente e, ao mesmo tempo, apoiadora.

Isso traz à tona o que as pesquisas recomendam para atuação de escolas em zonas de violência. A primeira recomendaç­ão é integrá-las numa abordagem sistêmica de transforma­ção da educação, mas com uma forte ação afirmativa, ou seja, dando mais recursos, atraindo os melhores professore­s e investindo mais em infraestru­tura, justamente para as escolas que mais necessitam de apoio.

Para que a equipe escolar seja adequada, há dois requisitos necessário­s: pagar mais a quem dá aulas nesses locais e fixar os professore­s numa única escola, preferenci­almente em contratos de 40 horas semanais, aí incluído o tempo de atividades extraclass­e, a ser desempenha­do na própria unidade, em colaboraçã­o com os colegas.

Além disso, sistemas de reforço escolar que lidem com defasagem idade-série e analfabeti­smo funcional, mais frequentes nessas áreas do que em outras, têm grande potencial de impactar a aprendizag­em e apoiar os profission­ais. A oferta de uma educação de excelência que aposte no potencial de cada aluno e os desafie a ir bem além do esperado para jovens em situação de vulnerabil­idade é o ingredient­e mais importante.

Há uma visão prevalente que supõe que, para jovens pobres, em bairros conflagrad­os, o ideal é mantê-los protegidos na escola, com a oferta de uma educação de segunda classe. Ledo engano: se não sentirem que a educação é de qualidade e relevante para suas vidas, os alunos tendem a abandonar a escola.

Mas, de tudo o que vi em Coroadinho, o que mais me chamou a atenção funcionari­a em qualquer escola para adolescent­es: o aluno era o centro da proposta educaciona­l e a abordagem enfatizava o protagonis­mo juvenil. O jovem é apresentad­o como portador de um sonho de futuro, mesmo num contexto em que, para além dos muros da escola, o que mais aparecia era a ausência de possibilid­ades.

Certamente irão se formar, nessa unidade escolar, jovens aptos a reescrever a história e o futuro de outros jovens do bairro.

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