STF manda tribunal militar liberar arquivos da ditadura
Decisão atinge inclusive papéis que foram classificados como secretos; presidente da corte diz que não recorrerá
Relatora do caso, a presidente do STF, Cármen Lúcia afirmou que ‘a Constituição não privilegia o sigilo’
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu por unanimidade nesta quinta-feira (16) que o STM (Superior Tribunal Militar) deve permitir o acesso público a documentos da corte referentes ao período da ditadura militar.
Os ministros do Supremo entenderam que o STM desrespeitou decisão de 2006 do STF, que garantiu amplo acesso aos áudios das sessões públicas e das sessões secretas realizadas pelo tribunal militar naquela época.
A decisão abrange inclusive os papéis que foram classificados como “secretos”.
A ação foi levada ao Supremo pelo advogado Fernando Fernandes, que tenta, desde 1997, obter cópias de fitas para usar os arquivos em livro em homenagem a advogados que defenderam acusados de crimes políticos.
Ele reclamou não ter acesso aos documentos mesmo após o STF já ter decidido sobre o tema em 2006. Na ocasião, a Segunda Turma do STF entendeu que a Constituição só permite a restrição da publicidade quando há necessidade de preservar a intimidade da pessoa ou no interesse da sociedade e do Estado, o que não era o caso.
O tribunal militar, no entanto, permitiu acesso apenas a parte do material dos julgamentos.
Durante a ditadura, os julgamentos eram divididos em audiências públicas e secretas. Nas públicas, havia a leitura de relatórios e sustentações orais; nas secretas, os ministros colhiam os votos. DECISÃO Em seu voto, a presidente do STF, Cármen Lúcia, relatora da ação, afirmou que o STF afastou os “obstáculos” que impediam que se tornassem públicos os atos praticados no tribunal militar e que são de interesse público para cidadãos brasileiros.
“A Constituição não privilegia o sigilo”, disse Cármen Lúcia, acrescentando que “não há nos modelos políticos que consagram a democracia espaço possível reservado ao mistério”.
Em parecer datado de fevereiro de 2014, o procuradorgeral da República, Rodrigo Janot, considerou procedente a reclamação do advogado e se posicionou pela determinação ao STM “do acesso integral do reclamante aos registros de áudio de todas as sessões daquele tribunal realizadas na década de 1970, independentemente da anterior classificação em registros públicos e secretos”.
O novo presidente do STM, José Coêlho Ferreira, disse que não há motivos para recorrer da decisão e que a Justiça Militar não tem “nada a esconder”.
Para ele, que assumiu o cargo nesta quinta (16), o advogado que ingressou com o pedido, contudo, está equivocado, porque, segundo ele, desde 2010 os documentos têm sido disponibilizados.
“Desde 2010 estamos digitalizando todos os arquivos e, sempre quando alguém so- licita, nós damos o acesso a eles. Estão liberados os documentos”, disse.
Questionado sobre o motivo de o advogado não ter tido acesso aos documentos, o presidente disse que talvez tenha havido algum equívoco na forma da solicitação ou na análise do STM. “É uma política pessoal minha que as coisas sejam abertas”, afirmou.