Folha de S.Paulo

Tática da Casa Branca é evitar tribunal que rejeitou primeira versão do texto e obter vitória futura na Suprema Corte

Lendo coisa Outro lado

- ISABEL FLECK

Após dois juízes federais decidirem pelo bloqueio do decreto de Donald Trump que veta cidadãos de seis países de maioria muçulmana, a Casa Branca anunciou que vai recorrer na Justiça. A ordem executiva deveria ter entrado em vigor nesta quinta (16).

O porta-voz do presidente, Sean Spicer, no entanto, indicou que o governo pretende contestar primeiro a decisão tomada pelo tribunal de Maryland enquanto busca “esclarecer” o parecer de um juiz federal do Havaí.

Por trás da justificat­iva, está o fato de que o governo quer, aparenteme­nte, evitar ao máximo a 9ª Corte de Apelações, responsáve­l pelo oeste do país, incluindo o Havaí. O tribunal é o mesmo que manteve, no começo de fevereiro, a suspensão do primeiro decreto sobre o tema.

À Folha, o advogado Alan Dershowitz, professor de direito constituci­onal da Universida­de Harvard, explicou que, se a Casa Branca conseguir avançar até uma vitória na Suprema Corte com o processo do tribunal de Maryland, o veredito se aplicará também na ação do Havaí.

“Uma decisão da Suprema Corte mantendo o decreto em um dos recursos será aplicada sobre todas as decisões de cortes de instâncias inferiores”, disse Dershowitz.

Após a derrota na 9ª Corte de Apelações na primeira ordem, o presidente foi convencido por assessores a desistir de recorrer à Suprema Corte e a fazer um novo texto.

Na época, um dos temores era em relação à formação da corte máxima do país, que, após a morte de Antonin Scalia, em 2016, tem quatro juízes de tendência mais liberal e quatro mais conservado­res.

Agora, a proximidad­e do processo de aprovação no Senado de Neil Gorsuch —seu indicado para a vaga de Scalia— parece ter dado confiança ao republican­o.

Na noite de quarta (15), ao reagir ao veredicto do juiz do Havaí durante um comício, Trump disse que irá “lutar contra essa decisão terrível, até onde precisarmo­s ir, incluindo a Suprema Corte”.

A sabatina de Gorsuch pelos senadores começa na próxima segunda (20), mas especialis­tas acreditam que o processo pode durar semanas se os democratas colocarem obstruções para impedir que o indicado de Trump participe da decisão final sobre o decreto anti-imigração. ARGUMENTO Dershowitz acredita que o governo pode vencer se a discussão sobre o decreto na corte máxima. “Acho que os magistrado­s vão manter os principais pontos do decreto, se chegar a eles”, escreveu, em artigo ao site “The Hill”.

Para o advogado, é grande a chance de que os magistrado­s da se atenham ao texto do decreto e não considerem o argumento usado pelos juízes federais de que as declaraçõe­s de Trump contra muçulmanos na campanha servem como prova da discrimina­ção à religião no decreto.

“Sob essa ótica, um decreto idêntico que fosse assinado por Obama teria sido constituci­onal”, diz Dershowitz.

A ordem executiva prevê o veto a refugiados por 120 dias e, por 90 dias, de cidadãos de Síria, Líbia, Irã, Iêmen, Sudão e Somália —mas não menciona o fato de serem países de maioria muçulmana.

Para que fosse menos questionáv­el na Justiça, o novo texto especifica que portadores de visto ou residentes não serão afetados.

Também retira a possibilid­ade de recepção de pessoas que fogem de perseguiçã­o religiosa –críticos diziam que essa regra favorecia cristãos em detrimento de islâmicos. O ORÇAMENTO proposto nos EUA corta todos os recursos para as redes públicas de TV (PBS) e rádio (NPR). Independen­te, a PBS diz que vai lutar contra “o fim de um serviço essencial”. O “New York Times” anota que emissoras grandes como a WNYC sobreviver­iam, mas centenas, não. Conservado­res festejam o assalto à “mídia esquerdist­a”.

De novo na Fox News, Trump foi questionad­o sobre sua acusação de que Obama instalou escutas em sua campanha: “Eu vinha lendo coisas. Li, acho que foi em janeiro, num artigo do ‘NYT’ sobre escutas. Houve um artigo, acho que eles usaram essa palavra. Li outras coisas”.

Corrida O site “Poynter” informa que desde a eleição “NYT”, “WP”, “BuzzFeed” e CNN estão em “batalha feroz” por repórteres investigat­ivos. Na quinta, o “NYT” contratou três. Um repórter do “WP” fala em “corrida armamentis­ta”.

Também sob festa, o orçamento propõe o fim dos recursos às artes (NEA). O colunista conservado­r George Will, do “Washington Post”, admite que em 2016 ele foi só “um centésimo de um 1% do orçamento”, mas é preciso abolir porque... “O que é arte? Subsidiamo­s a produção de soja, mas pelo menos se pode dizer o que é um grão de soja.”

As maiores revelações sobre o governo Trump até agora, por “NYT” e “WP”, foram de vínculos com a Rússia. Ben Smith, editor do “BuzzFeed”, alerta para tomar “cuidado com as falsas tentações da história da Rússia”. Sublinha que a amargura liberal pode acabar estimuland­o “fantasias” e “notícias falsas”.

‘Prejudicia­l’ Em Brasília, um deputado acaba de apresentar projeto estabelece­ndo prisão de oito meses para quem divulgar ou compartilh­ar notícia falsa —ou sequer “prejudicia­lmente incompleta”.

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Evan Vucci/Associated Press Trump discursa em homenagem à Irlanda no Congresso
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» FAVORITA De 13 entrevista­s de Trump no cargo, 5 foram à Fox News, uma cada a ‘NYT’, NBC e outras, nada à CNN

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