Folha de S.Paulo

A agenda da produtivid­ade

- JOÃO MANOEL PINHO DE MELLO COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: João Manoel Pinho de Mello; sábado: Marcos Sawaya Jank;

DESPEÇO-ME DESTA coluna. Serei eternament­e grato à Folha. Foi uma honra.

A coluna foi interrompi­da precocemen­te por um convite para ajudar na formulação e na implementa­ção de políticas que aumentem a produtivid­ade da economia brasileira. Escrevi em uma coluna: “Há quatro formas de aumentar o PIB per capita. Três são intuitivas: acumular máquinas (capital), colocar mais gente para trabalhar (trabalho) e qualificar o trabalhado­r (capital humano). Capital, trabalho e capital humano explicam parte das diferenças de renda entre países e de sua evolução ao longo do tempo.

A parte não explicada é a produtivid­ade. É a quarta forma de crescer: produzir mais bolo com os mesmos ovos e a mesma farinha, ou seja, o fermento”.

Nossa produtivid­ade patina há décadas, como demonstram vários analistas, incluindo este escriba. Por isso, o cresciment­o brasileiro foi frustrante desde a década de 1980. Em que pesem avanços importante­s, como a derrota da inflação e a diminuição da pobreza, nosso desempenho esteve muito aquém do que poderíamos. Ainda estamos em busca do esquivo cresciment­o sustentáve­l.

A boa notícia é um copo meio cheio: há muito o que melhorar. O cresciment­o sustentáve­l depende das decisões que estamos tomando neste momento. Tudo começa pela correção os desequilíb­rios fiscais, o que exige uma reforma previdenci­ária nos moldes que o governo federal propõe.

Mas, além do fiscal, a agenda da produtivid­ade é crucial. Ela já começou, mas a tarefa é longa. Se aumentarmo­s sistematic­amente a produtivid­ade por vários anos, entregarem­os para nossos filhos um país tão próspero como a Austrália hoje. Caso contrário, entregarem­os algo parecido com a Grécia, com sorte.

A agenda da produtivid­ade é de todos os governos, federal, estaduais e municipais. E é não só dos atuais governos mas também do que os seguirão. E é não só dos Poderes Executivos mas também dos Poderes Legislativ­os e Judiciário­s Brasil afora. E é não só dos poderes públicos mas, principalm­ente, da sociedade.

Compete à sociedade a decisão de abraçar a agenda da produtivid­ade. Por vezes, ela será dura, assim como o é o ajuste fiscal. Mas abraçar a agenda não basta. É preciso ajudar com ideias e propostas.

A ação do governo é importante, evidenteme­nte. Mas ele não é sabe-tudo, pelo contrário. No passado recente erramos ao acreditar que, desde Brasília ou de quaisquer gabinetes em outras capitais, adivinharí­amos o que era melhor para os que produzem. O que impede o empreended­orismo? Quem saberá melhor são os próprios empreended­ores. Eles podem ajudar. O governo deve buscar a ajuda.

A ajuda deve vir na forma de propostas que aumentem produtivid­ade, a única maneira de crescer de forma sustentáve­l. A melhora da produtivid­ade fará crescer os lucros, assim como os salários e a arrecadaçã­o, mas é preciso estar claro que aumento de lucro e melhora de produtivid­ade não são equivalent­es.

O lucro pode aumentar à custa do contribuin­te (isenção tributária), do fornecedor (forçar os fornecedor­es de energia a vender por um preço artificial­mente baixo) ou do comprador (proteção tarifária ou conteúdo local). Essas formas de aumento de lucro são disputas por fatias do mesmo bolo.

O bolo cresce quando o aumento de lucro vem da melhora da produtivid­ade. É como se usássemos um fermento melhor. E é do aumento no tamanho do bolo que sairão os recursos para construir uma sociedade mais próspera e justa.

O bolo cresce quando a alta de lucro vem da melhora da produtivid­ade; é como se usássemos fermento melhor

JOÃO MANOEL PINHO DE MELLO,

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