Incidência de câncer colorretal aumenta entre os mais jovens
Estudo americano com 490 mil pacientes mostra tendência, que também é percebida no Brasil
Não se sabe bem o porquê, mas possíveis explicações vão de problemas de detecção a maus hábitos de vida
A doença estava longe do radar. A dificuldade em ir ao banheiro e os intensos sangramentos demoraram para suscitar a hipótese de câncer colorretal. Em dezembro de 2013, a estilista Ana Paula Monteiro, 39, recebeu a notícia de que tinha a doença, já em estágio avançado.
“E sou magra, ativa, sempre comi de maneira saudável, nunca tive caso na família… Nem eu nem os médicos desconfiávamos”, diz Ana.
Andréa Hagime Nakayama, 40, achou estranho quando, em abril de 2015, percebeu um aumento na frequência com que ia ao banheiro. “Em maio, queria ir o tempo todo. Em junho senti dores para sentar e depois houve sangramento — aí sabia que possivelmente seria um sintoma [do câncer]”.
Ana Paula e Andréa não estão na faixa etária mais afetada pela doença —a média no diagnóstico está entre 60 e 65 anos—, mas podem ser exemplos de uma nova tendência que mostra o aumento da incidência de câncer colorretal entre jovens, ao contrário do que acontece com quem tem mais de 50 anos.
Um estudo feito nos EUA com dados de mais de 490 mil pessoas mostrou que os jovens de hoje têm um risco muito maior que os jovens do passado de ter a doença.
A probabilidade, apesar de baixa —1 caso em cada 100 mil para quem tem entre 20 e 29 anos—, gera preocupação pelo fato de estar aumentando com o tempo, especialmente a partir da década de 1980, quando estava na casa de 0,5 para cada 100 mil.
Já para quem tem entre 60 e 64 anos a chance de ter câncer colorretal é 50 vezes maior do que o dos jovens. A questão é que esse risco está diminuindo — na década de 1980, era o dobro disso. O trabalho saiu no “Journal of the National Cancer Institute”.
No Brasil não há dados tão precisos, mas um levantamento do A.C.Camargo Cancer Center mostra um panorama preocupante por aqui.
De 1.167 pacientes diagnosticados entre 2008 e 2015 com câncer colorretal, 20% têm menos de 50 anos. O paciente mais jovem tinha 23.
Talvez por isso a percepção de que jovens estão sendo mais vítimas da moléstia é compartilhada entre especialistas ouvidos pela Folha.
“É uma tendência preocupante, ainda mais que está claro que os casos de câncer vêm caindo anualmente desde os anos 90”, diz Samuel Aguiar Junior, diretor do departamento de tumores colorretais do A.C.Camargo.
As explicações para o aumento, porém, dividem os profissionais de saúde.
Para a nutricionista Maria Eduarda Melo, do Instituto Nacional de Câncer (Inca), o grande vilão é o consumo de comida ultraprocessada (como bacon e linguiças), além da epidemia de obesidade.
Já Sérgio Araujo, cirurgião do hospital Albert Einstein afirma que os principais fatores de risco, além de idade avançada, são presença de pólipos no intestino, histórico familiar positivo, cânceres prévios e tabagismo.
Além de atentar para os sintomas, não fumar e buscar um baixo peso, o que se pode fazer para tentar evitar o câncer é detectar os tais pólipos por exames como a colonoscopia. Pólipos são estruturas précancerosas que se formam a partir de alterações de um grupo de células na parede intestinal e não geram sintomas.
Em média, os pólipos levam dez anos para se tornarem tumores malignos, diz Claus-Henning Köhne, expresidente da Sociedade Europeia de Oncologia e especialista em câncer colorretal.
Em jovens, a coisa é mais complicada. Nessa faixa etária esse estágio de pólipo muitas vezes é “pulado”e vai direto para o de câncer. Mesmo que essas estruturas estejam lá, o exame para identificá-las costuma ser indicado só para quem tem mais de 50 anos.
Não seria economicamente vantajoso oferecê-lo para todos —muito dinheiro gasto para encontrar poucos casos.
Exames menos específicos como a busca por sangue oculto nas fezes também podem ajudar na detecção.
Já na fase de tratamento — geralmente uma combinação de radioterapia, imunoterapia e cirurgia—, os desafios são iguais para todas as idades e vão desde acesso às melhores terapias até mesmo o conhecimento dos médicos.
Köhne diz que há oncologistas que desconhecem as possibilidades de tratamento e que muitos não se atualizam. Identificar marcadores tumorais que indicam quais drogas têm mais chance de sucesso no combate à doença poderia ajudar na tarefa. Entre dos pacientes sobrevivem 5 anos após o diagnóstico, em média, dependendo do país
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