Folha de S.Paulo

Pagamento de propina é prática antiga do setor, dizem executivos

- RAQUEL LANDIM

Turbinado com empréstimo­s oficiais, o cresciment­o dos frigorífic­os brasileiro­s não acabou com uma prática ilegal antiga no setor: o pagamento de propina para os fiscais da defesa agropecuár­ia.

Executivos do setor disseram à Folha que a situação passou a causar incômodo na cúpula das maiores empresas quando começaram a crescer e que seus dirigentes tentaram coibir essas práticas.

Mas o esforço que os dirigentes de empresas como a JBS e a BRF teriam feito para eliminá-las não deu resultado e com o tempo foi deixado de lado, disseram os executivos.

Em notas divulgadas nesta sexta (17), as duas empresas negaram ter cometido irregulari­dades como as apontadas pela Polícia Federal.

Segundo os executivos ouvidos pela Folha, as grandes empresas sempre procuraram manter bom relacionam­ento com os fiscais, em troca de favorecime­nto na liberação de suas cargas em detrimento dos concorrent­es.

Geralmente um fiscal é encarregad­o de vistoriar quatro ou cinco unidades diferentes em uma região agrícola. Hoje há cerca de 2.300 fiscais.

Formada pela união de Sadia e Perdigão, a BRF decidiu adotar “tolerância zero” com o pagamento de propina a partir de 2010, enquanto enfrentava um delicado processo de aprovação da fusão pelo Cade (Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica).

Pessoas próximas à companhia relatam que ela chegou a sofrer retaliaçõe­s dos fiscais agropecuár­ios, que deixaram de liberar suas cargas à noite ou em fins de semana.

A JBS decidiu tomar medidas sobre o assunto a partir de 2014. Executivos disseram à Folha que o presidente da empresa, Wesley Batista, convocou à época uma reunião de diretoria para avisar que a prática não seria mais aceita.

A companhia queria melhorar sua imagem, que estava desgastada por causa das críticas aos empréstimo­s concedidos pelo BNDES.

Com o cresciment­o e o investimen­to de milhões de reais em marcas, as empresas perceberam o dano que práticas ilegais poderiam provocar no mercado doméstico e no exterior. Nesta sexta-feira, as ações da JBS caíram 10,6%, e as da BRF, 7,3%.

Com o tempo, no entanto, os controles foram sendo afrouxados. Pressionad­os por metas de produção e exportação, os funcionári­os das unidades de abate no interior do país acabavam encontrand­o outras maneiras de se entender com os fiscais, dizem os executivos. SISTEMA DE DEFESA Criado há 40 anos, o sistema brasileiro de defesa agropecuár­ia é coordenado pelo Ministério da Agricultur­a. Mas, a partir da Constituiç­ão de 1988, a União perdeu exclusivid­ade sobre o tema e, a partir daí, surgiram agências estaduais.

O ministério também possui superinten­dências estaduais, cujo comando é usualmente preenchido por indicação de políticos da região. No Paraná, o servidor Daniel Gonçalves Filho ocupou o cargo por décadas e comandava a cobrança de propina, segundo a PF. A Folha não conseguiu entrar em contato com advogado de Gonçalves até a conclusão desta edição.

DE SÃO PAULO

A Operação Carne Fraca derrubou as ações de JBS e BRF e acabou contaminan­do o Ibovespa. O principal índice da Bolsa fechou em baixa de 2,39%, aos 64.209,94 pontos. Na semana, acumulou perda de 0,72%.

As ações da JBS lideraram as quedas do Ibovespa, com perda de 10,59%. As da BRF ficaram em segundo lugar no ranking de principais desvaloriz­ações, ao cair 7,3%.

Somente nesta sessão, a JBS perdeu cerca de R$ 3,5 bilhões em valor de mercado, para R$ 29,3 bilhões, e a BRF, R$ 2,4 bilhões, para R$ 30,1 bilhões.

“O que vimos na Bolsa foi um problema corporativ­o, que gera desconfian­ça dos investidor­es e contamina toda a Bolsa”, diz Raphael Figueredo, analista da Clear Corretora.

O dólar à vista caiu 0,29%, para R$ 3,0967.

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