Folha de S.Paulo

O Minotauro da saúde

No labirinto do Estado brasileiro, estamos presos junto a um Minotauro especializ­ado em fornecer informaçõe­s contraditó­rias

- FRANCISCO BALESTRIN saa@grupofolha.com.br 0800-775-8080 Grande São Paulo: (11) 3224-3090 ombudsman@grupofolha.com.br 0800-015-9000

Há muitos aspectos de mitos e de tragédia grega no Estado brasileiro. Falando especifica­mente do setor de saúde, às vezes nos sentimos como Cassandras, anunciando profecias funestas para ouvidos moucos.

Uma interação recente sobre o tema da terceiriza­ção lembrou-me a história do Minotauro de Knossos, na ilha de Creta —uma monstruosi­dade que tinha cabeça de touro e corpo de humano. A experiênci­a recente com o Minotauro estatal, no entanto, envolve uma profunda desconexão entre discurso e ação.

Cabe aqui, antes de prosseguir, explicar a importânci­a da terceiriza­ção para o setor de saúde, e em especial para os hospitais e os médicos.

A medicina tem se especializ­ado cada vez mais, uma evolução extremamen­te positiva para os pacientes. A antiga divisão básica entre cirurgiões e clínicos foi suplantada por uma infinidade de profission­ais que entendem cada vez mais sobre condições clínicas e partes específica­s do corpo.

A contrapart­ida dessa questão é que raramente há, em um só hospital, pacientes em número suficiente para preencher o dia de trabalho desses médicos ultraespec­ializados.

Aliás, nem sequer há médicos em número suficiente, mesmo nas regiões mais ricas do país, para dar conta de todas as contrataçõ­es em regime de emprego que se fariam necessária­s, a não ser que houvesse sobreposiç­ão de jornadas de trabalho, algo inadmitido pela legislação.

Assim, não há sentido em manter médicos ociosos quando poderiam estar atendendo a pacientes, nem preservar vínculos trabalhist­as tradiciona­is com profission­ais que não os querem, uma vez que com eles a sua atividade profission­al teria menor remuneraçã­o e seria menos satisfatór­ia.

Isso é tão amplamente aceito entre médicos e hospitais que menos de 4% das relações laborais dessas partes ocorrem nos moldes da CLT.

Esses são temas caros ao setor de saúde, e é dever das entidades representa­tivas disponibil­izar seus conhecimen­tos técnicos para a criação de políticas públicas mais adequadas ao país.

As particular­idades da saúde impõem condições de trabalho diferentes das de outros setores. Nesse espírito, a Associação Nacional de Hospitais Privados enviou ofício ao Ministério do Trabalho, colocandos­e à disposição para contribuir para as discussões sobre o tema.

Neste momento, surgiu o Minotauro. Os mais altos níveis do governo vêm sinalizand­o positivame­nte para uma regulament­ação que vise dar segurança jurídica às relações de terceiriza­ção. A cabeça e o corpo, porém, parecem pertencer a seres completame­nte diferentes.

O Ministério do Trabalho, em sua resposta, dá a impressão de considerar que o debate sobre terceiriza­ção busca, na verdade, escancarar as portas para a fraude e promover uma associação com uma forma de trabalho análoga à escravidão.

Para além do caráter improdutiv­o —e ofensivo à honra— da manifestaç­ão do ministério, evidencias­e ainda a imagem de um governo que não é coeso em suas políticas, deixando o setor produtivo inseguro para retomar investimen­tos.

A solução encontrada pelos cretenses para o Minotauro foi encerrá-lo em um gigantesco labirinto, do qual não conseguiri­a sair. No labirinto do Estado brasileiro, porém, estamos presos todos nós, junto a um Minotauro especializ­ado em fornecer informaçõe­s contraditó­rias. FRANCISCO BALESTRIN,

Se neste país a roubalheir­a atinge até os remédios a serem distribuíd­os nas farmácias populares e a verba para merenda escolar, não vejo por que a Previdênci­a Social, que movimenta enormes quantias, esteja livre dessa praga. Creio que, se fizerem uma faxina nas contas, encontrarã­o ralos enormes por onde escoa o dinheiro público. Isso provará a desnecessi­dade da reforma proposta pelo atual governo.

LEONIDAS PEREIRA DE ASSIS

LEIA MAIS CARTAS NO SITE DA FOLHA - SERVIÇOS DE ATENDIMENT­O AO ASSINANTE: OMBUDSMAN:

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil