Folha de S.Paulo

Servidor contrário a indicação para órgão nuclear é exonerado

Troca em comando de comissão ocorre após tentativa do governo Temer de aprovar nomes ligados a políticos

- LUCAS VETTORAZZO

Como a Folha mostrou na quinta (16), governo negociava cargos na Nuclep em troca de apoio no Congresso

O governo Michel Temer exonerou na sexta (17) o presidente da Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear), Renato Machado Cotta.

A demissão ocorre após tentativa frustrada de aprovar nomes para o comando da Nuclep (Nuclebrás Equipament­os Pesados), empresa controlada pela Cnen e vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia.

Conforme a Folha revelou na última quinta (16), o governo tentava usar cargos na diretoria da empresa como moeda de troca por apoio à reforma da Previdênci­a no Congresso.

A Nuclep fabrica equipament­os para a construção do submarino nuclear da Marinha e também da usina de Angra 3, em sua fábrica em Itaguaí (RJ).

O governo indicou à diretoria pessoas ligadas aos deputados federais Celso Pansera (PMDB-RJ), Aureo (SDRJ) e Alexandre Valle (PR-RJ). Os dois últimos são integrante­s de uma frente parlamenta­r que se opõe à reforma.

Inicialmen­te rejeitadas por uma comissão técnica da Nuclep, as indicações teriam de passar pelo crivo do Conselho de Administra­ção da empresa, em reunião na última quarta-feira (15). O conselho tem cinco cadeiras, ocupadas pelos presidente­s da Cnen e da Nuclep, um representa­nte da Marinha, um do Ministério da Ciência e Tecnologia e outro do Planejamen­to.

Na condição de controlado­ra da Nuclep, a Cnen tem o voto de desempate no conselho. O presidente Renato Cotta era justamente um dos que havia manifestad­o oposição às indicações.

Temendo derrota, o governo não apresentou os indicados para votação e exonerou Cotta, engenheiro da Coppe/ UFRJ e membro da Academia Brasileira de Ciências.

A exoneração foi publicada no “Diário Oficial” da União na sexta. No lugar dele assume o major brigadeiro da Aeronáutic­a Roberto Pertusi, que já ocupava vaga no Conselho da Nuclep, como representa­nte do Ministério da Ciência e Tecnologia.

A Folha apurou que o brigadeiro é indicação do ministro da pasta, Gilberto Kassab (PSD). Em geral, os indicados da Cnen ou são civis ou oficiais da Marinha, órgão responsáve­l pelo desenvolvi­mento do programa nuclear brasileiro. A Cnen foi criada em 1956 e atua na fiscalizaç­ão da produção e do uso de energia nuclear no país.

A Folha apurou ainda que a entrada de Pertusi é uma forma de conseguir passar no Conselho da Nuclep os indicados do governo. INDICAÇÕES Os nomes encontrara­m resistênci­a por descumprir­em a nova lei das estatais, sancionada pelo próprio presidente Temer em julho passado. Além de não terem notório saber na área nuclear, eles tiveram relação com a política nos últimos três anos, o que é vedado na legislação.

O indicado à presidênci­a, por exemplo, foi candidato a vice-prefeito de Itaguaí na chapa derrotada de Alexandre Valle, em 2016. O cotado para diretor comercial tentou se eleger em 2014 deputado estadual pelo Rio, com doação do padrinho Aureo. A indicada à diretoria administra­tiva foi cabo eleitoral de Celso Pansera em 2014.

Procurado, o governo não comentou.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil