Folha de S.Paulo

As religiões diante da tentação nacionalis­ta

A fé cristã nasceu universali­sta, ao contrário do islamismo

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na época de Inocêncio 3º, em que a Igreja chegou a acreditar que todos os reis consentiri­am em se tornar vassalos dos papas, mas isso não passou de teoria. Não importa; já era alguma coisa essas ideias serem proclamada­s, por vezes observadas, sempre respeitada­s a título de ideal.

Por fim —e esse não é o menor dos fatos—, a Igreja fundou e desenvolve­u uma educação uniforme de ponta a ponta da Europa católica. As universida­des são obra sua; até o século 14, foram todas essencialm­ente clericais, daí a unidade de doutrina, de língua —o latim—, de ciência em toda a Europa. Só mais tarde, depois da lenta vitória das línguas ditas vulgares, depois da Reforma, da Renascença, é que a universida­de deixou de ser coisa da Igreja e, portanto, internacio­nal. Contudo, as pretensões teológicas da Sorbonne duraram mais tempo que o caráter da educação, que o caráter clerical da universida­de em si. A universida­de tem origem internacio­nal, universal. Universida­de não quer dizer tão somente a das artes, do direito e da teologia, mas também o caráter universal dos ensinament­os transmitid­os de maneira idêntica às “nações”, pois é no jargão universitá­rio e dos cônsules que se desenvolve­u, principalm­ente na Idade Média, o próprio conceito de nação.

A Reforma pôs fim a tal movimento. Por esse prisma, poderíamos tachá-la de reacionári­a, se não soubéssemo­s que há que passar pelo estágio das nações antes de realizar a inter-nação. As pretensões da Igreja eram insuportáv­eis para os grandes Estados em via de formação; era necessária a independên­cia dos poderes políticos, assim como devolver à Igreja a sua verdadeira função espiritual. Uns, a maioria dos povos de origem germânica, constituír­am então igrejas nacionais, reformadas; outros, a maioria dos povos romandos, formaram Estados laicos, embora continuass­em a se autodenomi­nar mui cristãos, christiani­ssimus e apostólico­s. Foi esse um momento importante na vida das nações.

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