Folha de S.Paulo

O que fazer depois da lista

- CELSO ROCHA DE BARROS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Celso Rocha de Barros, terça: Mario Sergio Conti, quarta: Elio Gaspari, quinta: Janio de Freitas, sexta: Reinaldo Azevedo, sábado: Demétrio Magnoli, domingo: Elio Gaspari e Janio de Freitas

A ESTA altura, não se sabe bem o que seria considerad­o uma surpresa na lista de Janot. A única dúvida é se alguém politicame­nte relevante ficará de fora (Marina Silva, talvez?). Os outros que talvez comemorem sua ausência, como Bolsonaro, não foram comprados porque as empreiteir­as buscavam políticos competente­s o suficiente para participar de discussões e decisões importante­s. Em 30 anos de carreira legislativ­a, o máximo que Bolsonaro produziu em troca de seu alto salário de deputado foram duas ou três piadas sobre gays.

Os outros grandes quadros da política brasileira devem aparecer na lista. Sim, é importante saber o grau de envolvimen­to de cada um dos citados. Mas não se deixe enganar pela discussão sobre caixa 1 e caixa 2: o dinheiro pode ter entrado pelas mais variadas reentrânci­as, mas sua origem é um cartel de empreiteir­as que roubava dinheiro dos contribuin­tes. O cartel dava dinheiro para políticos em troca de tolerância à sua manipulaçã­o de preços. Todas as doações foram dinheiro do crime.

Alguns dos acusados terão negociado essa transação pessoalmen­te, outros o terão feito por meio de subordinad­os. Outros terão recebido dinheiro por serem aliados ou correligio­nários de alguém importante que vendeu um favor. Deveriam ter perguntado por que estavam recebendo dinheiro de empresas que faziam o grosso de seus negócios com o governo, mas não perguntara­m.

De qualquer jeito, fica claro que o sistema era esse, e já fazia tempo que era. Os esquemas vinham de décadas. Portanto, a primeira lição a tirar do episódio é: não, nunca houve uma época em que tudo fosse mais honesto.

O que havia eram ditaduras, como a que Bolsonaro apoiou, que teriam fuzilado Sergio Moro e Deltan Dallagnol quando suas investigaç­ões chegassem no primeiro assessor de ministro.

Em segundo lugar, não é razoável supor que todos esses políticos sejam gente pior que nós. Se todos aceitaram dinheiro do cartel, é porque devia mesmo ser muito difícil se eleger sem aceitá-lo. Portanto, enquanto a polícia e o Judiciário cumprem seu papel, precisamos pensar em formas de tornar nossas campanhas mais baratas. Se não mudarmos essas regras, mesmo que elejamos 500 Pepes Mujicas em 2018, em 2022 todos serão Eduardos Cunhas.

Em terceiro lugar, a Lava Jato é o início de uma transição de um tipo de capitalism­o em que a proximidad­e entre Estado e empresas se dava por captura, para um outro tipo, que esperamos mais dinâmico e transparen­te. Devemos discutir com mais vigor quais serão as regras desse novo arranjo, até para evitar a possibilid­ade de que a transição seja interrompi­da.

O custo de combater a corrupção nestes últimos anos foi muito alto: parte de nossa crise atual se deve ao desmantela­mento de empresas que compravam deputados e fraudavam licitações, mas eram também responsáve­is por parte importante do investimen­to nacional. Se conseguirm­os reorganiza­r nossa economia, agora dentro da lei, esse PIB perdido nos últimos anos será recuperado rápido, será pago várias vezes. Mas se pararmos no meio do caminho, ele terá sido perdido por nada.

Precisamos repensar o modelo de negócios brasileiro e precisamos de campanhas mais baratas. E, talvez, agora que ninguém pode fingir que é moralmente superior ao outro, consigamos discutir isso como adultos.

Não se deixe enganar pela discussão sobre caixa 1 e caixa 2. Todas as doações foram dinheiro do crime

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