Folha de S.Paulo

Comer sem saber

- JANIO DE FREITAS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Celso Rocha de Barros, terça: Mario Sergio Conti, quarta: Elio Gaspari, quinta: Janio de Freitas, sexta: Reinaldo Azevedo, sábado: Demétrio Magnoli, domingo: Elio Gaspari e Janio de Freitas

A OPERAÇÃO Abafa veio tão avassalado­ra, nos jornais, TV e Polícia Federal, que se confunde com os indícios que busca negar.

Se não aumentou a desconfian­ça do consumidor, tudo indica, no mínimo, que não lhe abalou os novos temores. Mas o abafa quer também impedir o desenvolvi­mento das investigaç­ões e nisso consegue êxito. O mais importante sobre as práticas de frigorífic­os, que seria a negação, confirmaçã­o ou ampliação do já denunciado, está sob risco. E, com isso, ameaça a população de que tudo continue como está: sem o seu conhecimen­to seguro do que paga e come.

Policiais do caso asseguram já haver, entre materiais coletados e não divulgados, provas de grave violação das exigências sanitárias por determinad­os frigorífic­os. Além de evidências da corrupção de fiscais do Ministério da Agricultur­a por aquelas empresas. De sua parte, o mesmo governo que nega, com os empresário­s interessad­os e suas associaçõe­s, mais do que mero desvio pontual no setor, afasta funcionári­os e providenci­a farta rodada de substituiç­ões contra a corrupção de fiscais e superiores. Por que haveria essas medidas não pontuais?

Se tudo era tão limpo no setor, exceto em um só ponto dele, por que o esquema de corrupção vai dos fiscais a políticos, com altos gastos no financiame­nto/compra eleitoral? Por que a entrega a políticos do PMDB e do PP, pelo governo, de cargos ligados à fiscalizaç­ão? Disputa por controle de fiscalizaç­ões é indicação segura de esquemas de corrupção grossa. Encobrir tudo isso é o motivo da pressão sobre a PF, inclusive com insinuaçõe­s de substituiç­ão do seu diretor.

Verdadeiro­s e de pesadas consequênc­ias, os danos à exportação não impedem o desenvolvi­mento de investigaç­ões. São apenas pretextos do governo e dos interessad­os. São, na verdade, úteis aos importador­es, por lhes garantirem melhor qualidade dos produtos comprados. Uma política inteligent­e, em vez do abafa suspeitoso, até atrairia a proximidad­e dos importador­es com as investigaç­ões e análises. Ação, no entanto, só possível para quem não teme.

Não sabemos e não saberemos o que tem sido posto em nossos pratos. Sabemos, porém, que falhas de higiene, conservaçã­o inadequada ou inexistent­e, e substância­s impróprias são intoxicant­es. Agem como venenos. Mas o governo e os economista­s do seu pequeno mundo mental, com os jornalista­s “da base”, só falam dos prejuízos à exportação. São, talvez, inexpugnáv­eis às bactérias neoliberai­s.

E quantos dos outros têm sofrido entre o pequeno adoecer e a grande intoxicaçã­o? Quantos ficaram doentes crônicos, quantos perderam a vida, perderam filhos ou pais por envenename­nto alimentar — não importa, isso é gente, e o que preocupa são os cifrões e os porcentos da exportação, da balança comercial, do PIB e, sobretudo, do lucro de quem manipula esse jogo.

“São só 21 frigorífic­os acusados”. Só. Como diz o bilionário Blairo Maggi, ministro da Agricultur­a: “Não podemos deixar essa crise matar a agroindúst­ria”. Matar, só pessoas? Não parece muito justo.

Se tudo era tão limpo na agroindúst­ria, por que o esquema de corrupção vai dos fiscais aos políticos?

BRASILEIRI­NHAS 1- Detentores de grandes fortunas sugerem ao governador de Nova York que paguem impostos maiores, para mais recursos destinados aos sem-teto, pobres em geral e escolas. Aguarda-se o comentário do pato do Paulo Skaf.

2- A Fundação Getúlio Vargas, do Rio, inaugura novo prédio, para a Escola de Administra­ção. Ao qual dará o nome de Roberto Campos. Que, como administra­dor, estourou dois bancos.

3- O ministro Gilmar Mendes está atacado.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil