RICA POR 2 (DOIS) DIAS
Este texto sobre um fim de semana no Fasano Boa Vista vai ser xingado, mas estou tão refinada que seu destempero nem sequer ressoa em minha pele
FOLHA
Dei de presente para meu marido aniversariante um fim de semana no Fasano da Fazenda Boa Vista. Pra quem não sabe (eu não sabia até semana passada), é um lance finíssimo a menos de duas horas de São Paulo.
Eita que este texto vai ser xingado até. Milhares de pessoas panfletando contra os absurdos da reforma da previdência, e eu, mais uma vez, falando do meu umbigo? Essa colunista é um desserviço e... Meu amigo, estou tão refinada que seu destempero nem sequer ressoa em minha pele hidratada, experimentei ser rica por dois dias e posso garantir a vocês: é melhor do que ter pressão baixa em bloquinho de Carnaval no largo da Batata. Sim, dá uma certa culpa, mas ela fica meio dissipada ali pela piscina climatizada com fundo infinito e ofurô cromoterápico.
Meu problema não é cervicalgia, meu travesseiro é que não custou mil reais. Meu problema não é refluxo esofágico, meu quarto é que não tem vista para lindos e pequenos pássaros raros. Estar atrasada nunca foi exatamente minha culpa: meu secador de cabelos é que não presta pra nada. Essas foram algumas das descobertas da viagem. Pra você ter uma ideia do que eu estou falando, o lugar é tão magia pura que preferi fazer amor a ter uma crise de ansiedade. Isso não acontecia desde o verão de 2012.
O chuveiro tinha 67 jatos que carinhosamente desarmavam todos os meus gatilhos de dor. Se me perguntarem hoje o que quero da vida. Mesmo. Sem brincadeira. Eu diria: aquele chuveiro. Paz mundial? O fim das guerras? Tá, vai, e mais aquele chuveiro. Tomava pra base de uns dez banhos por dia. Nunca mais serei tão limpa em vida. LAGO FALSO Sabe IPVA, IPTU, DAS, GPS, CNH? Eles não sabem. A sala esbanjava a vista para um lago falso. Daí eu te pergunto: aventura? Trilha? Barraca? Insetos loucos? Nunca mais. Lago falso deveria ser sinônimo de intensa felicidade no dicionário do papo reto. Dele se ouvia uma bossa nova baixinha alternada com musicas clássicas baixinhas. Os hóspedes falavam ainda mais baixinho. Um dia eu espirrei e foi como um grito de horror no maior eco do mundo. Passei a controlar meus espirros, não ornava com o recinto. Quis chamar Pedro, meu amado cônjuge, que caminhava a uns cinco metros de distância, e achei por bem mandar mensagem. Não deu pra ouvir NENHUMA conversa de ninguém, até hoje não sei se eles emitiam mesmo sons com significado ou imitavam peixinhos dourados.
Chica travou as fezes. A pobre cachorra (que no primeiro dia ganhou cama e manta e fraldas e ração e água e potes personalizados e cartinha de boas-vindas) ficou assustadíssima com o ambiente, achando fazer cocô algo muito classe C. Só voltou para sua rotina fecal quando chegou em minha casa e retomou contato com a realidade.
No deslumbrante spa, tentei fazer uma drenagem linfática relaxante mas não foi necessário. Ao tomar conhecimento do valor da massagem, as toxinas do meu corpo morreram do coração.
O quarto (já escrevi que era belíssimo?) tinha dezenas de pequenas garrafinhas Fasano estrategicamente espalhadas. Fui tomando como se fosse água (e era!) até que me dei conta de que elas poderiam não ser cortesia. E agora? Em dois dias eu havia me hidratado o suficiente para mais de um semestre. Me imaginei devendo milhões de reais, meu nome na lista da operação “aqua minerallis”, o nome da minha família afundado pra sempre em baixo teor de sódio. Liguei na recepção: oi, essas garrafinhas são cortesia? A mocinha demorou a entender minha pergunta. Nunca na história daquele hotel alguém ousou ser tão classe média.