Folha de S.Paulo

Evitar terrorismo é mais difícil quando o inimigo mora ao lado

- CLÓVIS ROSSI

FOLHA

O terrorista que matou três pessoas na quarta-feira (22) em Londres chama-se, informa a polícia, Khalid Masood, 52,nomeesobre­nomequeden­unciam a sua origem árabe. Mas não era nem imigrante nem refugiado nem esteve na Síria com o Estado Islâmico, preparando-se para atacar.

Nasceu em Kent, no próprio Reino Unido —uma clara evidência de que muros e/ou outras barreiras contra imigrantes podem até reduzir o número de chegadas, mas não vão conseguir eliminar o terrorismo.

Não, ao menos, esse tipo rudimentar de terrorismo, que usa armas (um veículo e uma faca) ao alcance de qualquer pessoa.

É praticamen­te impossível evitá-lo quando o terrorista se dispõe a matar e morrer no mesmo ato, como aconteceu com Masood na quarta-feira.

Os serviços de segurança do Reino Unido monitoram cerca de 3.000 britânicos, a maioria islamistas, vistos como potencialm­ente capazes de praticar atos terrorista­s.

(O fato de que a maioria é de islamistas não quer dizer que outras tribos sejam imunes ao extremismo. Agora mesmo, descobriu-se que foi um jovem estudante judeu quem disparou ameaças de bomba contra centros comunitári­os judeus nos Estados Unidos, o que assustou muito a comunidade judaica).

Masood já esteve sob vigilância, mas, por ser considerad­o “periférico”, não figurava na lista dos cerca de 500 que permanecem sob investigaç­ão ativa.

Só um número ainda mais limitado é objeto de vigilância física.

Falha dos serviços de segurança ou de informação? Talvez, mas o fato é que o radar do sistema judicial detectou Masood pela última vez em 2003, por posse de uma faca. Logo, fazia 14 anos que ele estava limpo, por assim dizer.

O número de agentes necessário­s para fazer a vigilância física dos 3.000 suspeitos potenciais seria grande demais e possivelme­nte de pouca valia: digamos que um policial estivesse seguindo Masood dia e noite.

Ele veria, portanto, quando Masood subiu ao Hyundai 4x4 com que atropelou pessoas na ponte Westminste­r.

Mas como poderia adivinhar que subir ao veículo nesse dia particular, ação corriqueir­a e banal, seria o prelúdio de um atentado?

Que esse tipo de terrorismo veio para ficar demonstra-o a repetição (mas sem vítimas desta vez) de um ataque em rua movimentad­a no dia seguinte ao evento de Londres: foi nesta quinta-feira (23), na principal rua comercial da cidade belga de Antuérpia.

Como Masood, o terrorista potencial era de origem árabe (Mohamed R.), mas não era imigrante. Era francês e residente na França.

É óbvio que ataques terrorista­s similares, no ano passado, como os de Nice (França) e de Berlim, devem ter inspirado Masood, que, por sua vez, inspirou o agressor de Antuérpia.

Terrorismo vive (também) de publicidad­e —e é impossível evitar o abundante noticiário em torno de atentados.

Mesmo que a mídia tradiciona­l fizesse um impossível pacto de censura em torno deles, as mídias sociais se encarregar­iam de difundi-los à população.

Como disse o prefeito de Londres, Sadiq Khan, as grandes cidades (e as médias, como a belga Antuérpia, também) precisam se dar conta de que, a qualquer hora, em qualquer lugar, podem ser vítimas de um ataque.

Ainda mais que o inimigo mora ao lado.

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