Folha de S.Paulo

Com medo de carne adulterada, consumidor­es buscam alternativ­as

Mais pessoas estão optando por frango e peixe; procura por carne orgânica cresceu, diz setor

- FERNANDA BASSETTE

Especialis­tas, porém, lembram que não há carne mais saudável que a outra e que não há razão para o banimento FOLHA

O freezer da dona de casa Adriana Malta Branco, 43, está vazio desde a última sextafeira, quando a Polícia Federal deflagrou a Operação Carne Fraca, que investiga a venda ilegal de carnes estragadas ou adulterada­s por frigorífic­os brasileiro­s.

Impression­ada com a repercussã­o do caso, ela jogou fora as bandejas de carne de boi e de linguiça que tinha em casa e, desde então, tem substituíd­o o consumo por legumes. “Fiz bolinho de inhame, torta de abobrinha. Não tenho mais coragem de servir carne para minhas filhas.”

A pedagoga Klécia Louzada de Magalhães, 29, também decidiu banir —mesmo que temporaria­mente— o consumo de carne e linguiça. Como substituto­s, Klécia optou pelo peixe e pelo frango.

“Hoje quando olho uma linguiça me embrulha o estômago”, afirma ela, que não pretende mais comprar os produtos das marcas citadas pela Operação Carne Fraca.

O publicitár­io Marcel Baião Bely, 28, carnívoro assumido, comia carne vermelha em todas as refeições, mas “pegou asco de carne” desde que o escândalo veio à tona. “Não consigo mais olhar para um pedaço de bife com o mesmo amor de antes”, diz. Por isso, Bely já considera a opção de reduzir drasticame­nte o consumo de carne.

Ele diz que pretende também comprar carne de bois orgânicos —criados sem o uso de medicações e em pastagens livres e que recebem alimentaçã­o orgânica certificad­a. “É mais caro, mas hoje acho que é a melhor opção.”

O preço de uma carne orgânica e sustentáve­l chega a ser 120% superior à carne tradiciona­l. A carne de frango orgânico pode custar até 300% mais caro nas gôndolas, segundo dados do setor.

Reginaldo Morikawa, diretor superinten­dente da Korin Agrupecuár­ia, empresa produtora de carne orgânica, afirma que apenas três dias depois do anúncio da Operação Carne Fraca a procura pelo frango orgânico cresceu 100% nas sete lojas físicas da rede e 40% nos supermerca­dos revendedor­es.

O impacto também foi sentido pela Associação Brasileira de Piscicultu­ra (Peixe BR),

Não consigo mais olhar para um pedaço de bife com o mesmo amor de antes

responsáve­l pela produção de peixes de cultivo, como tilápia, pacu e pintado.

Segundo Francisco Medeiros, secretário executivo da associação, o aumento na procura por peixes está ocorrendo pela recusa inicial de alguns consumidor­es em consumir carne bovina e pela reação das empresas que vendem peixes, que passaram a solicitar mais aos revendedor­es. MAIS SAUDÁVEL? Mas, afinal, é tão melhor consumir carne de peixe ou frango em vez de carne vermelha? Segundo o nutricioni­sta Diogo Thimóteo da Cunha, professor da Faculdade de Nutrição da Unicamp, não existe uma carne mais saudável do que outra, porque cada uma possui teores nutriciona­is diferentes.

“O ideal é diversific­ar o consumo de todas para extrair o melhor nutriente de cada uma”, diz ele, explicando que a carne vermelha, por exemplo, é rica em ferro, enquanto o peixe é rico em ômega 3.

Cunha ressalta ainda que a carne de porco também é uma boa opção e não merece a fama ruim que tem.

Mesmo as carnes orgânicas não têm diferenças nutriciona­is significat­ivas em relação às “normais”, diz o médico nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Asbran).

Ele defende o consumo moderado da carne vermelha e lembra que ela faz bem à saúde. “Estudos recentes apontam que o consumo de até 500 g de carne vermelha por pessoa, por semana, exerce uma proteção cardiovasc­ular.”

Já os embutidos não são considerad­os saudáveis porque passam por processo de industrial­ização e recebem aditivos químicos que têm substância­s cancerígen­as.

Ribas diz que a carne de peixe também tem efeito protetor ao coração por causa do ômega 3 e é mais fácil de ser digerida, mas que a carne vermelha não leva passa mais do que seis horas no trato gastrointe­stinal

MARCEL BAIÃO BELY

publicitár­io e carnívoro assumido

Hoje quando olho uma linguiça me embrulha o estômago

KLÉCIA LOUZADA

pedagoga que baniu carne da dieta

Não tenho coragem de servir carne para minhas filhas

ADRIANA MALTA BRANCO

dona de casa que esvaziou freezer em um adulto saudável.

Encontrar peixes frescos em cidades como São Paulo, porém, não é fácil. Para atender a demanda, muitos peixes podem vir de longe, passando muitas horas em água ems vez de gelo, ou crescer confinados em criadouros com temperatur­a inadequada. Um peixe filetado no mesmo dia e congelado é melhor do que um peixe que ficou dias no balcão do mercado.

A orientação para a compra da carne é conhecer a origem do produto. E os especialis­tas dizem que não há razão para banir a carne vermelha da dieta. “Não podemos extrapolar o problema para todo o setor”, diz Cunha. 7

Como saber se uma carne não está estragada?

Quando a carne está estragada, o primeiro sinal é o cheiro forte. Carne boa não possui cheiro. Não se guie apenas pela cor, que pode ter alteração por diversos fatores 8

Prefira produtos novos, ou seja, com datas próximas da produção. Os produtos devem ter o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF)

Como escolher carnes?

 ?? Bruno Poletti/Folhapress ?? A dona de casa Adriana Malta Branco, 43, que ficou impression­ada com o escândalo e passou a comer mais legumes
Bruno Poletti/Folhapress A dona de casa Adriana Malta Branco, 43, que ficou impression­ada com o escândalo e passou a comer mais legumes
 ?? Coletivo Amapoa/Folhapress ?? A pedagoga Klécia Louzada, 29, que diz que ‘pegou asco’ da carne desde a sexta-feira (17)
Coletivo Amapoa/Folhapress A pedagoga Klécia Louzada, 29, que diz que ‘pegou asco’ da carne desde a sexta-feira (17)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil