Folha de S.Paulo

Fica, Temer

- ELIO GASPARI

Depois dele, o que há na vitrine das carnes? A escolha será do Congresso, eoqueelete­maoferecer?

DEPOIS DO fracasso das manifestaç­ões de domingo e do bate-boca do procurador-geral Rodrigo Janot com o ministro Gilmar Mendes, Michel Temer é o que há de melhor para levar o país até as eleições de 2018.

Ele foi eleito na chapa de Dilma Rousseff, conhecendo a mecânica de suas obras e suas pompas. Desde que assumiu a Presidênci­a da República, Temer empenha-se num projeto de reformas que traem o mandato das urnas de 2016 e nessa reencarnaç­ão patrocina uma agenda que jamais explicitou em sua vida pública. Pode-se não gostar da reforma da previdênci­a ou da nova ordem trabalhist­a, mas é indiscutív­el que, sem o Congresso, nenhum dos dois projetos iria adiante.

O mandato de Temer está pendurado numa decisão do Tribunal Superior Eleitoral. Admitindo-se que ele venha a ser deposto, será substituíd­o por uma pessoa eleita indiretame­nte pelo Congresso encalacrad­o na Lava Jato. Se essa eleição viesse a ocorrer sob a influência da pressão das ruas, seria possível que Temer fosse substituíd­o por alguém parecido com D. Eugenio Salles, que se juntou ao Padre Eterno em 2012.

Essa carta saiu do baralho porque depois de ter assombrado a oligarquia nacional durante três anos, as manifestaç­ões de rua desmilingu­iram-se. Hoje quem elegerá o novo presidente será o Congresso, influencia­do pelos constrangi­mentos e culpas expostos pela Operação Lava Jato.

Temer ofereceu-se para o lugar de Dilma Rousseff como um governo de salvação e união nacional. Em menos de um ano o presidente formou uma poderosa bancada parlamenta­r mais interessad­a em salvar a si própria. Ainda assim, quem ia para rua gritando “Fora, Temer” deve reconhecer que as coisas pararam de piorar. A inflação de dois dígitos sumiu da agenda e a recessão econômica pode ter chegado ao fundo do poço. Se a sua política merece apoio, ou mesmo tolerância, essa é uma questão que pode ser decidida em 2018, na eleição presidenci­al. A alternativ­a a esse cenário seria o culto ao “Fora, Temer”.

Para o seu lugar iria uma pessoa eleita pelo Congresso. Atire a primeira pedra quem puder dizer que os parlamenta­res elegerão alguém que mereça mais confiança, mesmo que seja pouca a que se deposita no doutor. Indo-se um passo adiante: atire a segunda pedra quem for capaz de garantir que esse novo presidente respeitará o calendário eleitoral que prevê uma eleição presidenci­al para 2018.

Nas duas últimas vezes em que se mexeu com a legitimida­de de um vice-presidente, o Brasil acabou metido em memoráveis encrencas. Assim se deu em 1969, quando os “três patetas” (na expressão de Ulysses Guimarães e do general Ernesto Geisel) dispensara­m o vice Pedro Aleixo, e em 1961, quando tentou-se impedir a posse de João Goulart.

(Nessa ocasião Ulysses não chamou os ministros militares de patetas, mas Geisel lembrava-se que o adjetivo já circulara.) Quando o vice foi deixado em paz, Itamar Franco deixou o país no porto seguro de Fernando Henrique Cardoso.

Sem a rua, o “Fora, Temer” é uma delegação de poderes para a oligarquia parlamenta­r que luta pela vida sonhando com o fim da Lava Jato, com o voto de lista e com a eleição indireta de um napoleãozi­nho civil. Solução oligárquic­a, ela terá inevitavel­mente uma agenda secreta: o fim da eleição presidenci­al de 2018.

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