Folha de S.Paulo

Revés econômico

Governo eleva tributos para cobrir rombo no Orçamento, o que torna necessário debate político para minorar os efeitos colaterais do ajuste

-

A incipiente e acidentada recuperaçã­o da economia brasileira sofre novo baque com a decisão do governo Michel Temer (PMDB) de promover aumento de impostos.

Pelo que se anunciou, a providênci­a principal será reverter parcialmen­te a desoneraçã­o tributária das folhas de pagamento das empresas, com exceção para os setores de construção civil, transporte coletivo e comunicaçõ­es.

Espera-se arrecadar com a medida R$ 4,8 bilhões até dezembro, necessário­s, conforme as explicaçõe­s da equipe econômica, para ajudar a tapar o rombo recém-constatado no Orçamento.

Na reavaliaçã­o periódica de suas receitas e despesas, o governo calculou que as primeiras ficarão neste ano R$ 55 bilhões abaixo do inicialmen­te estimado; as segundas, R$ 3 bilhões acima.

Com isso, o Tesouro Nacional caminharia para um deficit de caixa de R$ 197 bilhões em 2017, enquanto a meta —se é que podemos chamar assim a previsão de um resultado largamente negativo— é um de R$ 139 bilhões.

Na argumentaç­ão oficial, tamanha diferença não pode ser compensada apenas com corte nos gastos, sob pena de inviabiliz­ar obras em infraestru­tura e atividades essenciais da administra­ção pública.

Reconheça-se, de início, que há razoabilid­ade em não tolerar um saldo orçamentár­io pior. Uma escalada da dívida pública, afinal, implicaria danos ainda mais duradouros ao país.

Reconheça-se também que a estratégia de desoneraçõ­es da gestão Dilma Rousseff (PT), levada a cabo sem critério e planejamen­to, compromete­u a arrecadaçã­o e não obteve resultados satisfatór­ios.

Nada disso, porém, exime governo e Congresso de debater à exaustão as alternativ­as menos danosas para reequilibr­ar receitas e despesas. Há, no mínimo, três meses —o prazo legal até que a alta de tributos entre em vigor— para tal.

Não existirá, decerto, opção indolor. Ao onerar salários, põem-se em risco postos de trabalho; a elevação de outros tributos ou o corte de gastos gerará diferentes efeitos colaterais. Para minorá-los, devem-se levar em conta a dosagem e a tempestivi­dade de cada medida.

Escolhas baseadas em puro pragmatism­o político, aliás, contribuír­am para o desajuste de agora. Um exemplo foi a concessão de reajustes salariais generaliza­dos ao funcionali­smo federal, transferin­do a uma parcela elitizada dos trabalhado­res recursos que agora se tentam recuperar de afogadilho.

Para além das saídas mais cômodas, há pela frente vasta agenda para tornar o sistema de impostos mais equânime e conferir maior eficiência ao gasto público. Postergá-la, como se vê, sai muito caro.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil