Folha de S.Paulo

Mudança afeta maiores e vai gerar cortes, diz indústria

- FERNANDA PERRIN JOANA CUNHA

O governo anunciou nesta quarta-feira (29) um bloqueio de R$ 42,1 bilhões de despesas previstas no Orçamento e a reoneração da folha de pagamento de cerca de 50 setores para cumprir a meta de chegar ao fim do ano com um deficit de R$ 139 bilhões.

O contingenc­iamento foi de R$ 10 bilhões acima do pretendido pela equipe econômica, que sofreu um revés em três frentes de negociação. Na principal, deixou de contar com R$ 8,6 bilhões em receitas vindas de precatório­s. Isso porque teve uma derrota no STF (Supremo Tribunal Federal). A ministra Cármen Lúcia não liberou a contabiliz­ação desses recursos, algo que o governo acredita ser possível reverter.

Outro contratemp­o veio com a decisão da equipe política do presidente Michel Temer de não acabar plenamente com a desoneraçã­o da folha de pagamento.

A equipe econômica contava com cerca de R$ 6,5 bilhões até o fim deste ano caso fosse extinto o benefício para todas as empresas de mais de 50 setores.

No entanto, foram preservada­s empresas de transporte rodoviário, metroviári­o e ferroviári­o de passageiro­s, comunicaçã­o e construção civil, o que inclui grandes empreiteir­as que atuam em obras de infraestru­tura.

A frustração de receitas neste caso foi de cerca de 25%. Em vez de cerca de R$ 6,5 bilhões, agora contam com R$ 4,8 bilhões.

A medida entra em vigor em agosto e depende da aprovação pelo Congresso.

A equipe econômica também chegou a considerar um aumento de tributos com PIS/ Cofins, que poderia, na melhor das hipóteses, trazer R$ 16 bilhões em receitas —o que permitiria contingenc­iar cerca de R$ 30 bilhões.

Diante da pressão de setores da indústria, o governo optou apenas por acabar com a isenção de IOF (Imposto sobre Operações Financeira­s) em operações de crédito de cooperativ­as, o que trará R$ 1,2 bilhão em receitas.

Ao anunciar o fim das desoneraçõ­es para alguns setores, o ministro Henrique Meirelles (Fazenda) criticou a gestão de Dilma Rousseff, que desonerou empresas como forma de estimular a economia.

“Estamos corrigindo um processo do passado. Isso não gerou o efeito esperado [de geração de emprego]”, afirmou. “Existe a preservaçã­o de alguns setores altamente geradores de mão de obra e para os quais, de fato, essa medida faz efeito.” CORTES Em relação ao corte de despesas, o Ministério do Planejamen­to informou que R$ 10,9 bilhões serão bloqueados de emendas parlamenta­res. Outros R$ 20,1 bilhões serão retirados dos ministério­s (de maneira proporcion­al).

O PAC (Programa de Aceleração do Cresciment­o) teve R$ 10,5 bilhões bloqueados. Haverá ainda R$ 580 milhões de corte nos demais Poderes (exceto Executivo).

Na Saúde e na Educação, serão preservada­s as aplicações mínimas obrigatóri­as.

Apesar de um contingenc­iamento maior do que o previsto, Meirelles afirmou que as perspectiv­as para 2017 são boas e que poderá haver uma revisão desse bloqueio até outubro, quando se espera que a economia terá melhorado o ritmo de cresciment­o.

Nas análises da equipe econômica, o PIB do país já deve crescer 2,7% no último trimestre deste ano na comparação com o mesmo período do ano anterior. Em 2018, a previsão é de um cresciment­o acima de 3%. BRUNO BOGHOSSIAN MARINA DIAS,

Setores beneficiad­os pela desoneraçã­o da folha de pagamento se queixam de que o fim da política vai aumentar os custos das empresas em meio à recessão e gerar cortes de vagas.

O impacto será maior sobre companhias com muitos empregados ou que pagam altos salários. Nesses casos, a tributação de 1% a 4,5% sobre o faturament­o é mais vantajosa do que pagar 20% sobre a folha.

“O trabalhado­r de tecnologia da informação está entre os de melhor remuneraçã­o. O fim da desoneraçã­o vai gerar uma contração econômica violenta no setor”, diz Sérgio Gallindo, presidente executivo da Brasscom (associação das empresas de TI).

No setor têxtil, o impacto será maior sobre as indústrias de grande porte exportador­as, de acordo com Fernando Pimentel, presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção).

“A contribuiç­ão sobre o faturament­o não incide sobre a parcela exportada. Essas empresas perderão competitiv­idade em um momento em que o câmbio está desfavoráv­el”, diz. O setor de calçados faz avaliação semelhante.

No caso da indústria elétrica e eletrônica, a medida deve afetar fabricante­s de grandes equipament­os, e não de bens de consumo como celulares, afirma Humberto Barbato, presidente da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica).

Empresas cuja folha é reduzida diante do faturament­o já se “reoneraram” por conta própria. Dados da Receita Federal mostram que o número de optantes pela desoneraçã­o da folha diminuiu 45% entre 2015 e 2016.

Para Vanessa Canado, professora da FGV (Fundação Getulio Vargas) especialis­ta em direito tributário, faltam estudos que mostrem o resultado da política de impostos.

“A desoneraçã­o foi criada para gerar empregos. Se ela

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Pedro Ladeira/Folhapress O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ao anunciar os ajustes no Orçamento de 2017

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