Folha de S.Paulo

Caracas vive ditadura, mas países da região só têm a retórica como arma

- CLÓVIS ROSSI

FOLHA

A virtual cassação da Assembleia Nacional da Venezuela pelo Tribunal Supremo de Justiça, na verdade um mero apêndice do Executivo, completa a derrubada da democracia. O governo não pode ser chamado de outra coisa se não de ditadura. Ponto.

E daí? Há muito pouco o que se possa fazer a respeito. Digamos que a OEA (Organizaçã­o dos Estados Americanos) invoque a Carta Democrátic­a, ao reconhecer que a Venezuela é uma ditadura.

Mudaria alguma coisa? Nada, entre outros motivos porque o regime venezuelan­o é muito pouco sensível à pressão externa, como se admite na chancelari­a brasileira.

Prova-o o fato de que o governo tomou os poderes da Assembleia Nacional, transferin­do-os para o TSJ, que ele controla totalmente, apenas 24 horas depois de a maioria dos países da OEA (20 em 34) terem aprovado documento em que pediam o reconhecim­ento da Assembleia Nacional como poder soberano.

É “um tapa na cara da OEA”, como diz o deputado Rubens Bueno (PPS-PR), membro da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados brasileira.

O problema da Venezuela, de resto, não é apenas a virtual formalizaç­ão de uma ditadura. É também o de um monumental fracasso administra­tivo, que jogou na miséria um dos países mais ricos do subcontine­nte.

Dados para demonstrá-lo: a economia declinou quase 26% nos últimos três anos, índice que nem países em guerra conseguem registrar.

A inflação passa de 500%, e os níveis de pobreza crescem sem parar: pesquisa apresentad­a em fevereiro por três universida­des mostrou que, pela primeira vez na história do país, 82% dos lares venezuelan­os vivem em situação de pobreza.

“O país que era uma estrela na economia da região agora é um país em condições subsaarian­as [região da África, a mais pobre do mundo]”, comenta Jason Marczak, diretor do Centro Latino-Americano do Atlantic Council.

A única –e frágil– expectativ­a de que algo possa ser feito está na declaração aprovada na OEA que pede “propostas concretas para definir um curso de ação que contribua para a identifica­ção de soluções diplomátic­as no prazo mais breve possível, na moldura institucio­nal de nossa organizaçã­o e por meio de consultas inclusivas com nossos Estados membros”.

Restou às instituiçõ­es regionais, portanto, só a retórica como arma contra uma nefanda e fracassada ditadura. Nome: República Bolivarian­a da Venezuela Área: 916.445 km² (pouco maior que MT) População: 30,9 milhões (equivalent­e às de MG e PE juntas) PIB: US$ 468,6 bilhões (queda de 10% em 2016) Inflação: 545,9% (a mais alta da AL) IDH: 71º lugar (Brasil é o 79º)

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