Folha de S.Paulo

O diabo mora nas exceções

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BRASÍLIA - Ao reonerar a folha de pagamento das empresas como uma das medidas para tapar o novo rombo (R$ 58,2 bilhões) do Orçamento federal, o governo Michel Temer deixou a porta entreabert­a.

Resguardou três setores (comunicaçã­o, construção civil e transporte terrestre) do aumento de tributo com a justificat­iva de que são atividades intensivas em mão de obra. Diz ainda que, diferentem­ente da indústria, esses segmentos respondera­m melhor ao estímulo fiscal. O diabo mora nas exceções. Mesmos argumentos usados para a ressalva poderão ser empregados pelos setores de educação, TI, call center, transporte aéreo e outros tantos para pressionar o Congresso a alterar a medida provisória e anabolizar a lista de exclusões.

Foi com uma relação enxuta de quatro atividades (confecções, calçados, móveis e software) que Dilma Rousseff deu início à desoneraçã­o da folha em 2011. Não demorou para virar farra. O benefício foi esten- dido caoticamen­te a mais de 50 setores, gerando uma renúncia de R$ 74,9 bilhões entre 2012 e 2016, segundo dados da Receita Federal.

Sob a envergonha­da Dilma 2, veio o diagnóstic­o. Com as contas fiscais em desgraça, o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, escrachou a desoneraçã­o por ser “negócio grosseiro”, uma “brincadeir­a” que custava bilhões para a União. Levou o primeiro de vários puxões de orelha, mas traduziu em bom português o que estudos já apontavam.

A medida gera um custo nada trivial para a administra­ção pública, não tem grande capacidade de geração de empregos e pode aumentar a regressivi­dade do sistema tributário brasileiro.

Em 2015, Dilma mandou para o Congresso projeto de lei para rever a desoneraçã­o, recalibran­do as alíquotas sobre o faturament­o. A reoneração foi minada por lobbies setoriais, que conseguira­m atenuar a proposta de aumento. Na época, foram abertas várias exceções.

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