Folha de S.Paulo

Texto sobre abuso de autoridade ignora sugestões da PGR

O relator, Roberto Requião, afirma que a Procurador­ia quer afrouxar a proposta para proteger o Judiciário

- DÉBORA ÁLVARES

Entre as sugestões de Janot estavam a penalizaçã­o de quem constrange­r preso para obter vantagem sexual

A proposta de abuso de autoridade que deve ser votada na Comissão de Constituiç­ão e Justiça do Senado na próxima quarta-feira (5) deixará de fora sugestões feitas pela Procurador­ia-Geral da República. Entre elas, a penalizaçã­o de quem “constrange­r preso com intuito de obter vantagem ou favorecime­nto sexual” ou usar o cargo para dar a chamada “carteirada”.

Relator da proposta, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) se nega a acatar esse e outros pontos baseado em dois argumentos.

O peemedebis­ta reclama que os procurador­es foram chamados à discussão durante a elaboração do parecer, mas somente agora enviaram recomendaç­ões —o procurador-geral, Rodrigo Janot, entregou na última terça (28) um projeto elaborado a partir do relatório de Requião. O relator também acusa a PGR de querer afrouxar a proposta para proteger o Judiciário.

Segundo o procurador Helio Telho, do Ministério Público Federal de Goiás, que ajudou na elaboração do projeto do MP, há no relatório de Requião vários artigos que criminaliz­am a hermenêuti­ca (penalizaçã­o por interpreta­ção divergente de uma lei ou fato). Esse é o principal ponto alvo de críticas por parte do Judiciário.

O relator diz ter alterado um trecho que trata disso, o artigo primeiro, após ouvir o juiz Sérgio Moro no Senado em dezembro do ano passado. Porém, conforme Telho, artigos que tratam da tipificaçã­o também abordam essa punição.

“Criminaliz­ar a hermenêuti­ca é inconstitu­cional”, argumenta o procurador.

“Além disso, fechamos a descrição dos crimes. No projeto, o relator coloca tipos penais muito abertos, subjetivos, o que cria ainda mais inseguranç­a jurídica.”

O MP tinha ainda outras sugestões que acabaram não contemplad­as na proposta enviada ao Congresso. Queria, por exemplo, incluir como um tipo criminal o abuso de prerrogati­vas parlamenta­res ou de contingenc­iamento de emendas e orçamento para forçar apoio político. Segundo Telho, isso poderia ser interpreta­do como uma “afronta” ao Legislativ­o. SENADO O MP também questiona a tipificaçã­o, pretendida por Requião, de criminaliz­ar o ato de “decretar prisão preventiva, busca e apreensão de menor ou outra medida de privação da liberdade, em manifesta desconform­idade com as hipóteses legais”. Para o procurador Helio Telho, esse é um caso claro de tentativa de tolher o Judiciário.

“É o típico artigo encomendad­o para evitar novas prisões em grandes operações. Tem endereço certo e é a Lava Jato. O juiz pensa: vou mandar prender e se, depois, o STF diz que não era pra mandar prender, eu vou responder por abuso de autoridade”, afirmou.

Apesar das divergênci­as, a maior parte dos projetos é semelhante, contando com alguns ajustes de redação e das penas. “Tentamos estabelece­r uma proporcion­alidade entre os crimes mais graves e dar coerência jurídica à gradação de penas, para compatibil­izá-las com penas já previstas no Código Penal”, afirmou Telho.

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Pedro Ladeira - 29.mar.2017/Folhapress Rodrigo Janot, em sessão no Supremo Tribunal Federal IMPRENSA

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