Manutenção do dólar é proposta comum a candidatos no Equador
Moeda norte-americana começou a ser usada no país há 17 anos
“Tem certeza de que não é uma indígena equatoriana?”, perguntava, com olhar incrédulo, Erwin Díaz, 34, dono de um restaurante de comidas típicas no centro da capital Quito, na manhã chuvosa desta sexta-feira (31).
Díaz, assim como alguns clientes do local que se aproximaram para ver a moeda que a repórter da Folha exibia, disse não só conhecê-la como usá-la diariamente.
Todos, porém, acreditavam se tratar de uma moeda de dólar cunhada especialmente para o Equador, pois traz a imagem de uma mulher de traços indígenas carregando, nas costas, um bebê.
“É exatamente como nossas indígenas levam os filhos quando vão aos campos ou aos mercados”, completou Román Acosta, 22.
Quase aposentadas nos EUA, essas moedas, cunhadas a partir do ano 2000, tinham outra intenção, a de homenagear a população americana nativa por meio da heroína Sacagawea, da tradicional tribo dos Shoshone, que, no século 18, ajudou desbravadores brancos nos Estados de Idaho e Louisiana.
Só que, enquanto nos EUA o uso de moedas no dia-a-dia foi caindo —dando lugar aos cartões—, no Equador passou a ser ainda mais valorizado. Desde 2002, o Departamento do Tesouro americano já enviou US$ 150 milhões ao país sul-americano, apenas em moedas de um dólar.
Tudo isso remete ao traumático processo de inflação e desvalorização do sucre, que levou à adoção definitiva do dólar como moeda há 17 anos, na gestão de Jamil Mahuad (1998-2000).
“Todo mundo sentiu mais confiança quando chegaram os dólares. E preferimos moedas a cédulas. Houve tanta falsificação de notas no passado”, diz o comerciante Rubén Montoya, 58.
A manutenção da dolarização é um dos poucos temas comuns nas promessas dos candidatos ao segundo turno da eleição, no domingo (2). Nem o governista Lenín Moreno, que lidera as pesquisas (52,4%), nem o opositor Guillermo Lasso (47,6%) vislumbram abandonar o dólar.
“É o que nos dá estabilidade monetária”, explicou Moreno em reunião com empresários no começo da semana.
À Folha Lasso afirma que “a prioridade não é desdolarizar, mas sim despetrolizar a economia”, referindo-se à dependência equatoriana da commodity, cujos preços internacionais despencaram nos últimos anos.
Ambos preferem não questionar a dolarização devido a sua popularidade. Na época em que o dólar foi adotado, a inflação e a instabilidade política (presidentes caíam no meio do mandato) eram tamanhas que 3 milhões de pessoas deixaram o país.
Ganhe quem ganhe, os desafios econômicos do próximo presidente equatoriano não são poucos. Vão longe os tempos de “boom” das commodities, com o crescimento do PIB na marca dos 7,9%.
No ano passado, o PIB equatoriano encolheu 1,7%. E, de cordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional), o país em 2017 terá crescimento negativo, por volta dos -2,7%. (SC)