Credibilidade da fiscalização do país está em xeque, diz UE
Embaixador europeu afirma que é preciso mais informações para recuperação da confiança
O embaixador da União Europeia no Brasil, João Cravinhos, afirma que a credibilidade do sistema de fiscalização do país foi colocada em xeque pela Operação Carne Fraca, da Polícia Federal, que investiga um esquema de pagamento de suborno a fiscais agropecuários para emissão de certificados.
“Queremos evitar a suspensão da compra de carne brasileira, mas está nas mãos do Ministério da Agricultura.” Folha - O comissário da União Europeia Vytenis Andriukaitis disse que estuda medidas mais rigorosas para a importação de carne brasileira. Quais medidas seriam tomadas?
João Cravinhos - Essa crise apanhou a todos de surpresa. Já reforçamos a verificação na fronteira. Agora estamos checando visualmente tudo o que entra e fazendo exames biológicos em 20% dos produtos. O comissário deixou claro as informações técnicas que precisamos. Estamos aguardando uma carta do Ministério da Agricultura sobre o assunto.
Na próxima semana, haverá uma reunião entre os 28 países-membros da UE sobre saúde animal, e o tema também será discutido pelo Parlamento Europeu. Essa questão estará sob os holofotes em Bruxelas e precisamos de todas as informações para esclarecer as dúvidas. Queremos evitar uma suspensão da compra de carne brasileira, mas está nas mãos do ministério. O Ministério da Agricultura argumenta que os problemas de qualidade estão restritos a poucas unidades frigoríficas. A Europa tem dúvidas sobre a qualidade da carne brasileira?
Nós dependemos inteiramente de confiança num sistema de fiscalização agropecuária que conhecemos no papel e por meio de visitas pontuais. Quando há uma investigação da Polícia Federal que diz que a prática não corresponde a teoria, tocam todos os sinos de alarme. Não sabemos se isso é verdade ou falso, mas a credibilidade foi colocada em xeque.
Portanto, precisamos das informações adicionais que permitam restaurar a confiança que foi abalada. A investigação da PF apontou uma forte promiscuidade na relação entre as empresas e os fiscais agropecuários, inclusive com o pagamento de suborno. Essa questão preocupa a Europa?
Se houve suborno, precisamos saber se é pontual ou sistêmico e se isso gera algum perigo para o consumidor europeu. A princípio, ninguém suborna um fiscal para exportar carne de boa qualidade.
Mas o fundamental para a Europa é que o Brasil tenha um mecanismo de fiscalização que separe as carnes que não estão em condições de serem comercializadas.
Se esse resultado é alcançado de forma pouco ortodoxa, as autoridades brasileiras devem procurar resolver. A Operação Carne Fraca pode prejudicar o acordo de livrecomércio entre Mercosul e União Europeia?
Não. Esse tema não é discutido nesse tipo de negociação, que abrange principalmente cotas e tarifas. Não vai entrar carne sem qualidade na UE, com ou sem acordo. Na semana passada, negociadores dos dois blocos econômicos estiveram reunidos em Buenos Aires. Qual é a sua expectativa para a evolução das conversas?
Estou otimista. Em nenhum momento, desde que começamos a conversar, em 1999, houve um quadro tão favorável à conclusão das negociações.
Temos no Brasil e na Argentina governos muito comprometidos com um acordo, o que não acontecia no passado.
Do lado europeu, a determinação política nunca foi tão grande. Em um momento em que a globalização é colocada em xeque nos EUA e por movimentos dentro da própria Europa, temos que responder.