Mandaram a gente correr e atiraram com balas de borracha
FOLHA,
Na sexta (31), enquanto participávamos de uma pesquisa para a organização Update Politics sobre inovação política na América Latina, fomos surpreendidos por milhares de manifestantes que tomaram as ruas do centro de Assunção e atearam fogo no Congresso Nacional.
Eles protestavam contra manobra do Congresso, que aprovou a possibilidade de reeleição do presidente Horácio Cartes, algo proibido pela Constituição do país.
No fim da tarde, sem motivo aparente, a polícia que tomava conta do prédio simplesmente desapareceu, deixando a entrada livre para os manifestantes destruírem tudo o que viam pela frente.
Depois de horas, a polícia reapareceu e as ruas do centro da capital se transformaram em campo de guerra, com policiais disparando jatos de água, gás lacrimogêneo, bombas e balas de borracha.
Era nítido o despreparo e a agressividade dos policiais paraguaios. Sem nenhuma técnica, se espalharam desorganizadamente pelas ruas atirando e agredindo quem encontrassem.
Durante o enfrentamento, manifestantes cantavam palavras de ordem contra o presidente Cartes e seu antecessor, Fernando Lugo, acusando os dois —que são adversários— de se aproveitarem da maioria que têm no Congresso para dar um golpe parlamentar. Com os rostos cobertos e muita violência, eles diziam que o presidente planeja instituir uma nova ditadura no país, e que as ruas não iriam deixar isso acontecer novamente.
Por volta da meia noite, fomos encurralados por um grupo de policiais que nos mandou deitar no chão com as mãos na cabeça. Identificamonos como imprensa e obedecemos, mas mesmo rendidos eles começaram a nos agredir com chutes na cabeça e nas costas e coronhadas com a parte de trás da espingarda.
Depois de alguns minutos nos mandaram levantar e correr. Quando fizemos isso eles atiraram com munição não letal em nossa direção. O fotógrafo Rodrigo Machado foi atingido por quatro tiros nas costas e a fundadora do Update, Beatriz Pedreira, também levou um tiro nas costas. Por sorte, apesar de estar na linha de fogo, nenhum dos disparos me atingiu.
A dor e o sangue das agressões que recebemos deixaram claro que a inovação política que era o foco da nossa pesquisa havia sido atropelada pelo que existe de mais antigo e nefasto na viciada cena política da América Latina.