Vazamentos não devem levar a anulações, diz Cármen Lúcia
Para a presidente do Supremo, divulgações de delações devem ser apuradas
Segundo a magistrada, às vezes pessoas de fora do Estado, como parentes, vazam o conteúdo de acusações
A presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia, disse, nesta segunda (10), em Washington (EUA), que é preciso que se apure a origem de vazamentos sobre delações premiadas para evitar que sejam anuladas, beneficiando partes envolvidas nas investigações.
“É preciso realmente que se apure, para que depois não se diga que [o vazamento] foi nos órgãos do Estado, porque às vezes são pessoas de fora. E é claro que há acesso [às delações], pode ter pessoas que falem, pessoas da família falam”, disse a ministra, em conferência no Wilson Center.
“Então não se pode tentar, com isso, criar nulidades que vão beneficiar aquele que deu causa a essa situação”, afirmou, sem citar a Lava Jato.
Réus e citados por delatores na operação têm argumentado que os processos que os envolvem deveriam ser anulados ou sequer serem abertos devido ao vazamento de informações.
O presidente do TSE, Gilmar Mendes, já disse publicamente que a possibilidade de que delações vazadas venham a ser anuladas é real.
Em março, para se ter um exemplo, a defesa do presidente Michel Temer pediu ao TSE, que julga pedido de cassação da chapa vencedora em 2014, a anulação do depoimento do ex-presidente da Odebrecht Marcelo Odebrecht, alegando que ex-exe-
CÁRMEN LÚCIA
presidente do STF cutivos da empresa foram chamados a falar pelo tribunal somente após vazamento ilegal do conteúdo da delação.
“Eu acho que esse tipo de situação, quando a lei prevê o segredo que atinge o direito individual de alguém, tem que ser resolvido mesmo com a apuração de quem fez e quais as consequências disso”, afirmou Cármen Lúcia.
A ministra se disse contra o foro privilegiado “como ele está”. O foro permite que ministros, parlamentares e o presidente da República sejam julgados somente pelo STF.
“Não pode continuar como está”, afirmou, destacando que o foro foi estabelecido na Constituição de 1988, após a ditadura militar, quando um deputado ou senador corria o risco de ser cassado porque discordava do governo.
Na mesma palestra, a ministra defendeu que há espaço para discutir a adoção de uma cláusula que estabeleça critérios para que um partido tenha direito, por exemplo, a tempo de televisão. Ela criticou a existência de siglas sem ideologia definida.
“Essas legendas acabam prestando-se a ser alugadas e com isso nós temos a corrupção no processo. O brasileiro fica felizmente cada vez mais intolerante com qualquer forma de corrupção, e essa é uma delas, de oferecer o tempo de televisão e os seus espaços como forma de mercancia”, afirmou.
Cármen Lúcia disse ainda que o processo que culminou no impeachment de Dilma Rousseff obedeceu às regras.
“A Constituição garantiu a institucionalização democrática que, nesses quase 30 anos, já viu dois processos de impeachment de presidentes levados a efeito nos estritos termos constitucionalmente previstos e com os poderes estatais atuando rigorosamente nos termos juridicamente previstos”, afirmou.
Dilma Rousseff também está nos EUA, onde faz uma série de palestras para defender que um golpe a tirou da presidência.
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É preciso realmente que se apure, para que depois não se diga que [o vazamento] foi nos órgãos do Estado, porque às vezes são pessoas de fora. E é claro que há acesso [às delações], pode ter pessoas que falem, pessoas da família [de envolvidos] falam
‘VIVO BIBLICAMENTE’ A presidente do STF afirmou que não considera concorrer à Presidência e nem pensa sobre a possibilidade de assumir o poder, caso a chapa Dilma-Temer venha a ser cassada pelo TSE.
“Eu não considero nada disso, eu vivo biblicamente hoje. A cada dia, a sua agonia. A minha [agonia] hoje está nos processos”, disse.