Folha de S.Paulo

Hora certa para tomar sol

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RIO DE JANEIRO - Aconteceu outro dia: o comboio da Polícia Federal passando pelas ruas do Rio sob os aplausos da população. As pessoas sabiam que eles estavam indo em busca de algum bacana —executivo, empreiteir­o ou político— habituado a se esbaldar em Paris ou Nova York com o dinheiro que ganhou de propina, desviou dos cofres públicos, deixou de pagar em tributos ou extorquiu direto do nosso bolso. No Brasil, quando a polícia começa a ser aplaudida pelo povo, é porque chegamos às últimas instâncias da confiabili­dade.

Numa cidade de cartões postais, como o Rio, não será surpresa se essas caravanas começarem a se tornar atração turística —e gente é que não falta para prender. O chefe da quadrilha carioca, o ex-governador Sérgio Cabral, pode estar atrás das grades, mas seu esquema para assaltar o Estado tem-se revelado tão tentacular que desmantelá-lo ainda renderá muitas incursões a prédios de luxo da Zona Sul. O espetáculo é empolgante: o ilustre morador sendo conduzido para um carro preto sob vaias e bananas dos próprios vizinhos —nesse momento, encerram-se as relações de obas e olás no elevador ou até mesmo de amizade.

Sem falar nos desdobrame­ntos da lista de ilustres do ministro Edson Fachin. A investigaç­ão sobre cada um daqueles tubarões revelará a existência de inúmeros bagres e sardinhas que se encarregav­am de operaciona­lizarasfal­catruas—gentedeque­mnunca ouvimos falar, mas sem os quais a bufunfa não chegaria ao destino.

Enganam-se os que supõem que esses aplausos comemorem a prisão de membros da facção x ou y. Ao se descobrir iludido, roubado e falido de todas as maneiras por políticos em quem acreditou e que elegeu por larga margem, o Rio não tem mais preferênci­a.

Quer ver todos eles, não pelas costas, mas de frente e de perfil, e com hora certa para tomar sol. CLAUDIA COSTIN

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