Folha de S.Paulo

Estado de decomposiç­ão

Ações policiais e judiciais não transforma­m a sociedade. Só a cidadania ativa, politizada, viabilizar­á a superação do quadro que enoja o país

- CHICO ALENCAR

Mercadoria, negócio e lucro são três dínamos da economia capitalist­a, hegemônica no mundo. No Brasil, eles também imperam nas relações políticas. O poder público continua monopoliza­do pelas oligarquia­s do capital. A lista do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, atesta tal situação.

O Estado moderno organiza normas de coletivida­de. É, em tese, o gestor do espaço público. O Estado democrátic­o necessita de um mínimo de vínculo com o discurso de promotor do bem comum que o justifica.

A degradação nacional reside no fato de que o poder econômico colonizou a política e determinou seu modus operandi. Controland­o o Estado, a força avassalado­ra da classe economicam­ente dominante está “desproclam­ando a República”.

Os que estão no poder, ou na perspectiv­a dele, colocam agentes públicos para operar negócios com as grandes corporaçõe­s privadas. “Quem governa é o dinheiro”, denunciou o papa Francisco.

Esse fenômeno mundial é especialme­nte perverso no Brasil, onde quadrilhas políticas se estruturam e agem mascaradas de defensoras do interesse nacional.

A Lava Jato e todas as operações que, a despeito de excessos, buscam desmontar esquemas criminosos expõem a mesma estrutura funcional: corruptore­s e corruptos transforma­m o bem ou o serviço a ser oferecido à população em mercadoria, a partir de uma negociação que, mediante propina, dá lucro às partes, em prejuízo da maioria.

O voto-mercadoria, derivado do “bom negócio” das campanhas milionária­s, faz mal à cidadania. Resulta em governos a soldo de grandes interesses privados, com suas licitações viciadas e obras superfatur­adas. Em fiscais subornados, que nada fiscalizam. E em mandatos legislativ­os comprados, que produzem leis de acordo com o desejo de seus financiado­res.

Essas práticas nefastas envolvem todo o condomínio do poder, com seus inquilinos de ontem e de agora.

O Estado brasileiro já induziu modelos de desenvolvi­mento a partir da disputa legítima de interesses contraditó­rios.

O respeito mínimo à dignidade do trabalhado­r e o direito à segurança alimentar, ao teto, à saúde e à educação, duras e parciais conquistas, vieram de um duplo movimento: dos “de baixo”, organizado­s e pressionan­do por suas demandas, e das elites políticas, sensíveis a essas reivindica­ções —ou constrangi­das a acolhê-las.

Chegamos a uma situação de decomposiç­ão dos valores republica- nos elementare­s: com a mercantili­zação da política, o povo é levado a se desestimul­ar da participaç­ão política, a se tornar um consumidor passivo.

Um Estado assim privatizad­o, mesmo com tantas “faturas expostas”, empurra as pessoas à vida particular, ao alheamento em relação ao que é público. Assim atomizados, os indivíduos se consideram os principais culpados por seu próprio “fracasso”, como desemprego e carências de toda ordem.

Ações policiais e judiciais não transforma­m a sociedade: fazem um diagnóstic­o da podridão e atacam bactérias que aceleram a degeneraçã­o do corpo social. Só a cidadania ativa, politizada, viabilizar­á a superação do que hoje enoja.

Urge a mudança radical do modelo político falido, que jamais será reformado em profundida­de pelos que dele se beneficiam, pelos que legislam em causa própria e estão afogados na lama de tantas denúncias.

Provocado a sintetizar seu fecundo trabalho, Mário de Andrade disse: “Minha obra toda badala assim: Brasileiro­s, chegou a hora de realizar o Brasil!”. Só eleições livres e limpas legitimarã­o os protagonis­tas da imprescind­ível refundação da República. CHICO ALENCAR,

Diante desse descalabro obsceno a que assistimos com vergonha e revolta, é de se perguntar o que faziam, antes de Moro, o Judiciário, o Ministério Público, a Receita Federal, os tribunais de contas, a Polícia Federal, as polícias militares, as polícias civis, os marronzinh­os.

JOAQUIM QUINTINO FILHO

“Tudo foi feito dentro da lei!” Ora, sabemos que os delatados se julgam seres superiores à lei, que nós, simples cidadãos, temos que respeitar. Então nos resta saber a qual lei eles se referem. Seria à lei do “Eu tudo posso”? O poder é podre!

PAULO REIS

O respeitado­r do Estado de Direito e que crê em nossa Justiça espera que, primeiro, as investigaç­ões sejam feitas para, depois, diante das provas irrefutáve­is, condenar os culpados. Não se deve entrar em delírio de exaltada alegria se um antipatiza­do é apenas citado, como fazem alguns. Não há educação cívica neste país e a internet demonstra isso.

MARLY CARDONE

Após as delações de Odebrecht, tanto o atual Congresso como o governo Temer estão insustentá­veis. Precisamos de eleições diretas e democrátic­as urgentemen­te se quisermos salvar este país de um caos completo.

JUDSON CLAYTON MACIEL

Reforço o texto informando que, graças aos trabalhos de melhoramen­to genético desenvolvi­dos pelo Instituto Agronômico de Campinas, se conseguiu implantar a vitinicult­ura no Vale do São Francisco, no polo frutícola de Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), sendo esta, atualmente, a maior região exportador­a de uvas do país. A continuar com o governo do ajuste fiscal, com os cortes no orçamento em ciência e tecnologia, passaremos de uma república de bananas para uma republique­ta de frutas, de tão deletério que será para nosso país.

MAURILO MONTEIRO TERRA,

A Secretaria de Estado da Saúde esclarece que o professor e pesquisado­r Dimas Covas é um notável cientista, com experiênci­a e qualificaç­ão no meio científico e acadêmico que lhe conferem todas as credenciai­s para dirigir o Instituto Butantan. A indicação por esta pasta de seu nome para a instituiçã­o foi absolutame­nte técnica. Covas já está adotando as providênci­as necessária­s para reorganiza­r a gestão do Butantan, corrigindo os equívocos dos últimos anos (“Atual diretor do Butantan fez parte de auditoria que suscitou crise”, “Ciência+Saúde”, 13/4).

HÉLIA ARAUJO,

Transporte A Fetranspor não “argumenta” que créditos expirados em cartões eletrônico­s têm validade de um ano (“A invencível turma dos ônibus”, “Opinião”, 13/4). Há o amparo da lei estadual 5.628/09, de 2009, sob o mesmo princípio da lei federal 11.975/09, que reitera ser de um ano o prazo de expiração de cartões usados no transporte rodoviário. Os R$ 90 milhões referem-se ao período de cinco anos e são reinvestid­os integralme­nte no sistema de bilhetagem eletrônica. No mesmo período, o setor já investiu mais de R$ 500 milhões no sistema, sem que houvesse impacto na tarifa.

LÉLIS TEIXEIRA,

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