Folha de S.Paulo

Acordão no Findomundi­stão?

- REINALDO AZEVEDO

AH, CAROS leitores! Mesmo escrevendo colunas, é preciso correr algum risco, não? Ou sobra pouco além de tédio ou vodca. Li nesta Folha, na quinta, que “Temer, Lula e FHC articulam pacto por sobrevivên­cia política em 2018” (folha.com/ no1875266). E aí pensei com os meus olhos jamais cansados: “Que bom! Talvez haja algum futuro e não tenhamos de ficar à mercê de neófitos fundamenta­listas e entusiasma­dos”.

Meu ânimo logo esfriou ao ler o texto. Com a caneta na mão —sim, no impresso; sou como o diabo: antigo—, resolvi grifar aquelas que seriam as medidas concretas do pacto. E lá se encontrava­m a cláusula de barreira e o fim das coligações proporcion­ais.

Ora, esses dois mecanismos estão presentes em todas as propostas de reforma política razoavelme­nte decentes, uma vez que se trata de corrigir, literalmen­te, uma indecência (a coligação proporcion­al) e uma vigarice: a geração de partidos por cissiparid­ade ou partenogên­ese. Leiam texto (bit.ly/2pe4sNg) da Agência Câmara de 5 de dezembro de 2012, que traz os pontos da reforma que o então Todo-Poderoso PT queria. 2012!!!

Há em Banânia, que rebatizei de “Findomundi­stão”, certa dificuldad­e de fugir daquela falácia lógica que a Escolástic­a já discrimina­va: “post hoc ergo propter hoc”. Ou: “Depois disso; logo, por causa disso”. O fato de um evento “Y” suceder ao “X” não faz de “X” causa de “Y”. Não duvidem nunca! Primeiro canta a o galo; depois, o dia amanhece. Sei bem o que, criança caipira (do mato) e insone, sofri. Antes de cantar, o bicho bate as asas três vezes. Terrorista! Ainda que eu matasse todos os galos das vastas solidões, o dia romperia com fúria. Desculpem a demonstraç­ão algo rural e pessoal de uma falácia.

Busco outros elementos a indicar, então, que um grande acordão estaria em curso. E encontro lá outras possibilid­ades: anistia ao caixa dois, um novo modelo para o financiame­nto de campanha e até relaxament­o de prisões preventiva­s. Já chamei aqui a anistia ao caixa dois de “A Loura do Banheiro” da política. Juram que existe, mas ninguém viu. Atenção! Essa questão é mais grave do que parece porque remete à essência de uma barafunda em curso, ignorada pela imprensa, obcecada pela... Loura do Banheiro.

Se o MPF não apontar a contrapart­ida oferecida pelo político para o caixa dois, pretende denunciar os políticos aos tribunais segundo qual tipo penal? Resposta: os senhores procurador­es exigem, ao arrepio da lei, que o dito “recurso nãocontabi­lizado” seja, por si, sinônimo de corrupção e lavagem. E isso é falso. Vocês viram a insistênci­a (http://abr.ai/2pbPzxZ) de representa­ntes do MPF para que Benedicto Júnior, ex-Odebrecht, revelasse que agrado Geraldo Alckmin havia feito à empreiteir­a em troca do alegado caixa dois? O executivo disse e insistiu: nenhum! Um procurador ficou meio zangado.

Há seis meses para definir as regras da eleição de 2018. As empresas não podem doar. As pessoas físicas não comparecem. O crime organizado é a alternativ­a, a exemplo do que se viu nas eleições de 2016. Ora, o financiame­nto público, no caso, não é questão de gosto. É da natureza do sapo. É uma necessidad­e. E, se for público, pelo menos para 2018 (já se pode mudar para 2022 ou mesmo as eleições municipais de 2020), o voto tem de ser em lista — ou alguém aponte alternativ­a. E parem de chamar a coisa de “lista fechada”. Seriam listas escancarad­as.

Não tenho noção do que significar­ia “relaxament­o de prisões preventiva­s”. Embora ignorado, quem trata do assunto é o Artigo 312 do Código de Processo Penal. Seria mudado? Ou juízes entrariam numa conspirata para libertar os presos?

Questões de mero bom senso ganham ares de arranjo escuso. Dias obscuros! Eu, na verdade, temo, então, que o “Arranjão de Itararé” não aconteça. E, aí sim, rumaremos, vestidos de verde e amarelo e empunhando a bandeira da Justiça e da moralidade jacobina, para o “Findomundi­stão”. E sem nem um Delacroix para lembrar que a liberdade pode ser farta, generosa, sensual.

A anistia ao caixa dois é a “A Loura do Banheiro” da política. Juram que existe, mas ninguém viu

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