Folha de S.Paulo

Atitude de Marcelo Odebrecht vai de desafiador­a a submissa

Patriarca Emilio exibe estilo mais distanciad­o, enquanto Márcio Faria é teatral

- NELSON DE SÁ

DE SÃO PAULO

Háumanoeme­io,oMarcelo Odebrecht que surgiu diante das câmeras, em depoimento, era outro. Firme, por vezes desafiador, questionav­a as acusações com frases como “Nada ficou provado contra mim”. Sobre a prisão, reclamava de seu “efeito sobre a minha imagem”.

Nos novos vídeos, quando esses questionam­entos e preocupaçõ­es ficaram definitiva­mente para trás, ele obedece a tudo sem resistir.

Quando instruem que apresente seus dados pessoais “olhando para a câmara”, ele se vira, olha e aguarda nova ordem para começar a falar. E depois dá respostas também mecanicame­nte, sem emoção, às questões que vão sendo levantadas quase burocratic­amente.

A cena não indica humilhação, mas submissão, talvez resultado do tempo que já passou encarcerad­o, com vida regrada ao detalhe.

Quando muito, Marcelo Odebrecht se permite divagar sobre “como funciona a sistemátic­a”, a distribuiç­ão do dinheiro. Racionaliz­a que jamais gostou de “contrapart­ida específica” —o varejo— e que “ser um grande doador é sempre melhor” —o atacado.

Talvez fosse diferente o final da trama, é o que parece sugerir, se tivesse seguido o próprio gosto, em relação à sistemátic­a.

Muito diferentes são a empostação que Emílio Odebrecht, seu pai e patriarca do grupo, adota em vídeos de depoimento e a maneira como organiza a compreensã­o do que vinha sendo revelado.

Não desafia nem se submete, fala com distanciam­ento, como quem já está afastado do conflito, e com segurança, como quem não pode mais ser transforma­do em protagonis­ta, papel designado ao filho.

A distribuiç­ão de dinheiro surge como algo institucio­nalizado, para servir a um sistema político com partidos demais. O que porém não exime sua empresa, tratada em plural majestátic­o, porque, afinal: “Nós passamos a olhar isso como normalidad­e”.

Diferentem­ente do que acontece nos questionam­entos ao filho, tratado com frieza factual, o inquiridor do pai se permite racionaliz­ar também, dialogar.

Por exemplo, quando ouve que “tudo isso é feito há 30 anos”, o procurador toma a iniciativa de argumentar, quase pedindo aprovação:

“Sempre há um momento para começar a resolver. Estamos tentando mudar as coisas como vinham sendo feitas.Vamosverse­agentecon- segue melhorar o nosso país.”

Muito distante de ambos, pai e filho, é a presença de Márcio Faria da Silva em seus vídeos, os mais bombástico­s e teatrais, até onde foi possível assistir.

Ele não era proprietár­io, mas um funcionári­o —executivo— da Odebrecht, e seu tom é de quem atuava na linha de frente, no balcão.

Usa expressões como “um belo dia”, para iniciar o relato de sua reunião em 2010 com Michel Temer, e chama o procurador seguidamen­te de doutor.

Esparrama-se na cadeira, costurando detalhes como o fato de que o motorista precisou recorrer ao aplicativo Waze para achar o caminho e em qual posição cada um se sentouàmes­a.

Ele se estende sobre um lado e outro da mesa, parece estar numa conversa informal, reapresent­ando uma cena engraçada. Tanto quanto o que relata, é sua postura que desrespeit­a quem é hoje o presidente da República.

“Apresentaç­ões, muitas amenidades, falamos da política, eu até perguntei: ‘Mas, doutor, como é que é ser vice da Dilma? Dizem que é uma pessoa complicada’. Aí o pessoal riu, aquela coisa toda, e para minha surpresa, até com intimidade, falou: ‘Não, qualquer coisa, estes rapazes resolvem, ela vem e fica aqui.”

Os rapazes Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves fariam com que ela se sentasse emseucolo,descreveuo­delator, reproduzin­do o gesto de apontar o próprio regaço.

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Fotos Reprodução Márcio Faria, que chefiou a Odebrecht Engenharia Industrial
 ??  ?? O herdeiro e ex-presidente do grupo, Marcelo Odebrecht
O herdeiro e ex-presidente do grupo, Marcelo Odebrecht
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Emilio Odebrecht, pai de Marcelo e patriarca da empresa

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