Temer ignora proposta de gravar reuniões em gabinete presidencial
Medida de transparência fora cogitada pelo próprio peemedebista após crise com Geddel
Ex-ministro da Cultura registrou conversa com presidente; Planalto diz que ideia ainda está sob análise do GSI
O presidente Michel Temer não adotou medida de transparência proposta publicamente por ele mesmo de gravar as audiências promovidas no gabinete presidencial.
A ideia foi sugerida em novembro durante discurso presidencial, como resposta à crise protagonizada pelos exministros Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e Marcelo Calero (Cultura), que pediram demissão do governo federal dias antes.
Segundo a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto, o presidente não está gravando as audiências porque o tema ainda está em análise no GSI (Gabinete de Segurança Institucional) da Presidência e, por isso, ele não tomou uma decisão.
Calero deixou o governo após acusar, em entrevista à Folha, Geddel de pressionálo a produzir parecer técnico para viabilizar empreendimento no qual o chefe da Secretaria de Governo tinha apartamento na Bahia. Geddel negou as acusações, mas a crise levou à sua demissão uma semana depois.
Para provar a pressão, Ca- lero gravou conversas com Geddel, com o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) e com o próprio presidente, que chamou a iniciativa de “agressiva” e “clandestina”.
“Acho de uma indignidade absoluta alguém meter um gravador no bolso para gravar outrem, não é? Até dizem que isso já tem sido admitido, mas eu pessoalmente, não”, disse Temer à época.
Em entrevista dois dias depois da saída de Geddel, o presidente afirmou que considerava pedir ao GSI que gravasse as audiências no gabinete presidencial.
“Estou pensando em pedir ao GSI que grave —e aí, publicamente, não é clandestinamente— as audiências do presidente. Para que todos possam dizer o que possam dizer, e que eu possa dizer aquilo que devo dizer.” ‘LIMONADA’ ainda avaliava a hipótese, mas que a ideia era arquivar as conversas por “20 ou 30 anos”, realizando uma “depuração dos costumes” e fazendo de um limão uma “limonada institucional”.
“Eu, talvez, aproveitando essa gravação clandestina, ilógica, agressiva, desarrazoada, talvez deste limão nós façamos uma limonada institucional, fazendo com que as audiências públicas do presidente da República sejam todas gravadas”, afirmou.
No telefonema gravado por Calero, cujo áudio ele entregou à Polícia Federal, Temer disse ter sido “inconveniente” com o então ministro ao insistir para que ele permanecesse no cargo após o contratempo com Geddel.
“Quero pedir minha demissão e quero que o senhor aceite, por gentileza, porque eu não me vejo mais com condições e espaço de estar no governo”, afirmou Calero.
“Se é sua decisão, tem que respeitar. Ontem, acho que até fui um pouco inconveniente, né? Insistindo muito para você para você permanecer. Confesso que não vejo razão pra isso, mas você terá as suas razões”, respondeu Temer.
Em dezembro, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse não ver indícios suficientes para pedir abertura de inquérito para investigar Temer e Padilha. As suspeitas contra Geddel foram remetidas para a Procuradoria da República no Distrito Federal.
DE SÃO PAULO
A TV Cultura afirmou, em nota enviada à Folha , que censurou parte da apresentação da banda Aláfia no programa “Cultura Livre” para “evitar polarizações”.
Na atração, o grupo fez críticas ao prefeito de São Paulo, João Doria, e ao governador paulista, Geraldo Alckmin. Ambos são do PSDB.
Administrada pelo governo de São Paulo, a TV Cultura disse ter cortado o trecho para “não difundir ideias ou fatos que incentivem a polarização, independentemente do indivíduo a quem esse discurso se destina”. A emissora afirmou ainda que não utiliza “programação de arte e cultura para fins partidários”.
“Liga nas de cem que trinca/ Nas pedra que brilha/ Na noite que finca as garra/ SP é fio de navalha/ O pior do ruim/ Doria, Alckmin/ Não encosta em mim, playboy/ Eu sei que tu quer o meu fim”, dizia o trecho retirado na edição.
Procurada pela Folha ,a apresentadora do “Cultura Livre”, Roberta Martinelli, afirmou que só continuará no canal se tiver liberdade de expressão. “Eles se comprometeram a não interferir em nada.”
“Existe polarização política e questões que a gente vive no Brasil, mais canções de protesto vão surgir, não vai dar para a gente impedir”, disse.