Folha de S.Paulo

Para Mélenchon. A margem de erro é de 1,4 ponto.

- DIOGO BERCITO

ENVIADO ESPECIAL A MARSELHA (FRANÇA)

As eleições francesas, com primeiro turno neste domingo (23), podem ser decididas por dois candidatos populistas que defendem retirar a França da União Europeia.

Marine Le Pen, de extrema direita, e Jean-Luc Mélenchon, de extrema esquerda, estão entre os favoritos para o segundo turno em 7 de maio.

A força simultânea de populistas de direita e esquerda é atípica, diz o cientista político Cas Mudde, especialis­ta no tema. Professor na Universida­de da Geórgia (EUA), ele publicou neste ano “Populismo: Uma Brevíssima Introdução” (Gradiva, Portugal).

O sucesso de Le Pen e Mélenchon é explicado pelo desastre dos partidos tradiciona­is e apresenta riscos ao sistema, afirma. Mas a ascensão do populismo tem também consequênc­ias positivas, segundo Mudde. Esses partidos trazem à discussão questões que até então escapavam ao debate público, como a migração. “O problema é que dão as respostas erradas.”

Determinad­as experiênci­as populistas podem também servir de alerta e frear partidos em outros países, diz. Europeus estão observando o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e se assustam com os resultados. “Eles pensam que talvez não seja uma boa ideia tentar a mesma coisa em casa.”

Quatro candidatos lideram a disputa no primeiro turno francês. Uma sondagem publicada na quarta prevê 23,5% dos votos para o centrista Emmanuel Macron, 22,5% para Le Pen, 19,5% para o conservado­r François Fillon e 18,5%

Folha - Há preocupaçã­o na Europa quanto à possível vitória de Le Pen ou Mélenchon. Qual é o risco real?

Cas Mudde - O populismo é preocupant­e em si porque leva a uma polarizaçã­o. Esses políticos enxergam uma distinção moral entre eles e os outros, que chamam de “elite”. É difícil entrar em acordo, porque eles pensam que os seus oponentes não têm legitimida­de. Isso é um risco ao sistema. Tanto Marine Le Pen como Jean-Luc Mélenchon querem deixar a União Europeia, o que iria destruir o bloco econômico. Que contexto possibilit­ou o fortalecim­ento simultâneo de partidos populistas na direita e na esquerda?

A maioria dos populistas bem sucedidos na Europa vêm da direita. Há populistas de esquerda no sul do continente, por exemplo, na Espanha. Mas é um cenário único que ambos os populistas de direita e de esquerda tenham sucesso na França. Isso diz muito sobre o ‘mainstream’. Esses partidos só vencem quando o as siglas tradiciona­is falham. O sr. argumenta, em sua obra, que a Frente Nacional, de Le Pen, é um protótipo de todo o populismo europeu. Por quê?

Foi um dos primeiros partidos populistas e muitas de suas decisões foram copiadas em outros países, como a ideia de que “eu digo o que vocês pensam”. E foi um dos primeiros a ter sucesso relativo. O sr. tem reservas quanto ao uso do termo “populismo” para descrever esses partidos?

Esses partidos são mais do que populistas. Hoje tudo é reduzido ao populismo, o que não engloba todo o fenômeno. Há divergênci­as de ideologia que fazem, por exemplo, com que Le Pen e Mélenchon nunca possam trabalhar juntos. Parte do sucesso da Frente Nacional está em quebrar tabus, como discutir a crise migratória. Esses tabus estão rompidos para sempre?

Sim. É muito difícil reinstaura­r um tabu depois que ele seja quebrado. Mas o tabu da migração é relativo. A classe trabalhado­ra já discutia isso, era o ‘mainstream’ que não. O sr. diz que o populismo não é necessaria­mente negativo. Que efeitos positivos Le Pen e Mélenchon podem ter?

O populismo é positivo especialme­nte em países em transição a uma democracia liberal, o que a França já é. Então esse resultado seria pequeno. A contribuiç­ão deles é fazer as perguntas certas que não estão sendo feitas. O problema é que eles dão as respostas erradas. Partidos tradiciona­is podem responder essas questões?

Essas questões são vistas pelos eleitores como propriedad­e de certos partidos. A migração, por exemplo, é relacionad­a à Frente Nacional.

Se a centro-direita passasse a tratar disso, acabaria favorecend­o Le Pen, porque os eleitores diriam: “se o problema é a migração, então vou votar na Frente Nacional”. Há preocupaçã­o quanto aos impactos de uma eventual vitória de Le Pen em outras eleições europeias, como a da Alemanha. Eleições podem contagiar umas as outras?

Eleições nacionais são nacionais. Há um exagero na ideia de contágio entre elas.

É difícil que um eleitor decida votar em um candidato populista porque um populista venceu em outro país. O que pode acontecer é ele votar em um populista se pensar que um governo populista de outro país cumpriu suas promessas. É difícil, no entanto, que isso aconteça. E o inverso?

Europeus estão observando o presidente dos EUA, Donald Trump, e se assustam com os resultados. Pensam que talvez não seja uma boa ideia tentar o mesmo em casa. Ele terá esse cada vez mais esse efeito.

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