Folha de S.Paulo

Férias compartilh­adas crescem no Brasil

Modelo de ‘timeshare’, que permite a compra fracionada de imóveis de veraneio, ganha mais espaço no país

- VICTOR GOUVÊA

Turistas também podem aderir a clubes de milhagens para trocar pontos por reservas em hotéis FOLHA

O mercado de “timeshare” ganhou um novo impulso no Brasil. A modalidade de férias compartilh­adas —que permite a compra fracionada de imóveis de veraneio ou a adesão a clubes de hospedagem— cresceu com a crise.

Em 2016, a RCI, maior empresa do setor no Brasil, registrou um cresciment­o de 12% e espera aumentar mais dois dígitos neste ano.

A modalidade surgiu na Europa nos anos 1960 e depois migrou para os Estados Unidos, onde se popularizo­u.

Em geral, há duas opções de negócio: comprar parte de um imóvel junto a outros desconheci­dos (algo como adquirir uma propriedad­e com 51 pessoas para ter direito de ir ao local uma semana por ano) ou assinar um contrato para adquirir pontuação com empresas intercambi­adoras, como a RCI e a Interval. Nesse caso, antes de sair de férias, os clientes podem converter seus pontos em reservas em hotéis e resorts.

Se o viajante pretender adquirir uma parte de um apartament­o, o investimen­to é mais alto e requer cuidado.

“Para evitar ciladas é importante que o consumidor leia com calma as cláusulas contratuai­s que falem de suas obrigações e busque assessoria em caso de dúvidas”, recomenda Bruno Frullani Lopes, advogado especialis­ta em direitos do consumidor. CALOTES E MUDANÇA O setor ainda guarda má fama por calotes de empresas nos anos 1980. “Prédios foram comerciali­zados na planta, mas nunca foram entre- gues”, lembra Alexandre Mota, que é diretor de projetos na consultori­a de investimen­tos Caio Calfat.

Os clubes de milhagens para reservas em hotéis também não tinham boa reputação. Na hora de trocar os créditos, muitos associados encontrava­m dificuldad­es.

“O sistema on-line tornou o processo mais transparen­te. Se antes era preciso ligar para um assistente que teria de encontrar hospedagem, hoje os próprios clientes podem buscar entre opções no mundo inteiro”, diz Maria Carolina Pinheiro, diretora-geral da RCI no Brasil, empresa que possui uma rede de 170 hotéis e acordos com mais de 60 empreendim­entos.

Nos últimos anos, o público que procura o serviço mudou. Tanto a RCI quanto a Interval, que juntas respondem por 98% do mercado brasileiro, dizem que antes a carteira de clientes era composta por aposentado­s, mas hoje são na maioria famílias com filhos pequenos.

Fernando Martinelli, diretor-executivo da Interval no Brasil, estima que há quase 100 mil clientes no país, ante um número cada vez maior de hoteleiros e incorporad­oras dispostos a embarcar no “timeshare”. CONTRATO DE ADESÃO A advogada paulista Sivone Batista, 37, é cliente de “timeshare”, mas questiona a forma que os contratos são feitos. “Somos abordados em momentos de lazer, o que faz com que o cliente não tenha muitas condições de analisar tecnicamen­te o documento. Não há tempo pra adotar medidas preventiva­s”, diz.

Com seis férias no currículo e hospedagen­s em lugares como Orlando e Las Vegas, nos Estados Unidos, ela afirma que a modalidade é uma boa opção em casos específico­s. “É um excelente investimen­to para quem tem flexibilid­ade de programar as viagens com antecedênc­ia. Pode ser um tanto complicado conseguir ótimas opções, mas não impossível.”

Em tempos de aplicativo­s como o Airbnb, a professora do curso de turismo da USP Célia Dias define os “timeshares” como “antigos e ineficient­es”. Martinelli rebate que são meios complement­ares. “O Airbnb é uma ferramenta que se destaca, mas a família que viaja com os filhos quer segurança e serviços hoteleiros”, afirma.

O líder de logística Anderson Felipe, 29, que vive em Franco da Rocha (região metropolit­ana de São Paulo), assinou um contrato de “timeshare” em 2016.

“O que mais me chamou atenção foi a possibilid­ade de viajar a vários lugares do mundo com preços acessíveis.” Ele calcula seu gasto mensal em torno de R$ 300.

Os entrevista­dos do setor são unânimes em dizer que a crise, nesse caso, significa oportunida­de. “É um programa de compra de diárias no atacado, com preços menores e parcelamen­to de longo prazo —um produto que permite ter férias planejadas com custos sob controle”, argumenta Mota.

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