Folha de S.Paulo

‘Tuitaços’ e jovens evangeliza­dores impulsiona­m Bolsonaro nas redes

Apoiadores organizam postagens para colocar deputado entre principais assuntos da internet

- GABRIELA SÁ PESSOA

Parlamenta­r centraliza apoios na extrema direita, diz pesquisado­r da Universida­de Federal do Espírito Santo

“Digamos que as eleições fossem hoje. A gente sabe que Bolsonaro não teria espaço”, prevê o universitá­rio Raul Holderf, de 19 anos. “Não é de partido grande, não tem coligação, não tem tempo de rádio e TV. Nosso prazer é inverter isso, saber que o que acreditamo­s está ganhando voz.”

A um ano do calendário eleitoral, apoiadores de Jair Bolsonaro (PSC-RJ) já estão enfileirad­os para a disputa nas redes sociais. Com organizaçã­o militar e vocação evangeliza­dora, organizam “tuitaços” (postagens em massa no Twitter) para promover o deputado federal —sobretudo quando o clima não o favorece.

Em 7 de março, o Supremo Tribunal Federal manteve ação contra o parlamenta­r, acusado de estupro ao ofender a deputada Maria do Rosário. A tag #BolsonaroR­eidoMundo circulou por três dias —16 horas no topo no dia 8.

De acordo com a ferramenta Trendinali­a, Bolsonaro esteve 23 vezes nos trending topics do Brasil desde 1º de fevereiro. Nenhum dos cotados à Presidênci­a chega a esse patamar, sobretudo com uma base organizada.

Segundo Fabio Malini, coordenado­r do laboratóri­o de Estudos sobre Imagem e Cibercultu­ra da Universida­de Federal do Espírito Santo (Ufes), as redes no Brasil, sobretudo o Twitter, se dividem em três grandes grupos.

Bolsonaro é protagonis­ta da extrema direita. Há o “grupo do Ministério Público”, diz Malini, que defende as “Dez Medidas contra a Corrupção” e a Lava Jato, “com participaç­ão forte de procurador­es como o [Deltan] Dallagnol”. E a esquerda, em torno de Lula.

Bolsonaro chegou a 9% das intenções de voto na última pesquisa Datafolha, em dezembro. SEGURANÇA Raul Holderf comanda um dos principais grupos próBolsona­ro na rede, o @conexaopoI­itica, com “viés cristão, conservado­r, de direita”.

O jovem é o criador do perfil, que administra com amigos de quatro Estados e tem 3.500 seguidores. Em cinco dias, publicaram 314 tuítes, retuitados 2.900 vezes e “curtidos” por 5.900 usuários.

Malini, da Ufes, monitora Bolsonaro e outros políticos nas redes desde 2013. Coletou esses dados durante uma semana de fevereiro, a pedido da Folha: total de 54 mil tuítes.

O quarteto do Conexão Política está na casa dos 20 anos. Por WhatsApp, planejam os tuitaços com uma semana de antecedênc­ia. Na véspera, publicam o horário e a “hashtag”.

Estudante de letras, Holderf mora em Abreu e Lima (PE) e conheceu Bolsonaro quando precisou fazer um trabalho de escola, em 2011, sobre políticos do Sudeste.

O jovem é evangélico. Se identifica com as ideias sobre a segurança, como a defesa de que brasileiro­s possam andar armados, uma bandeira do ex-militar. “A casa onde eu moro foi assaltada cinco vezes no último ano”, diz.

São razões parecidas com a de seu colega Henrique Speck, 20, de Marechal Rondon (PR): “Vi uma declaração dele na TV, achei legal e fui buscar mais. Era sobre penas mais pesadas para bandidos. Hoje, os cidadãos de bem são reféns.”

Um dos usuários pró-Bolsonaro mais ativos atende por @SorataStan­dz. Misturando #SomosTodos­Bolsonaro com imagens de desenhos japoneses pornô, consegue fazer seis postagens em um só minuto.

O ritmo sugere que o perfil seja um robô —como a maioria da rede em torno do deputado, estimam especialis­tas em marketing político digital.

Indícios: o usuário é monotemáti­co e publica em padrões sobreumano­s. Segundo o Twitter, também “um grande número de respostas ou menções duplicadas” e “várias atualizaçõ­es não relacionad­as” a um tema.

“Robôs criam a sensação de que todo mundo está falando uma coisa. É o que os políticos estão buscando”, diz Fabrício Benvenuto, professor do curso de Ciências da Computação da UFMG.

É impossível saber quem controla os autômatos. Podem ser “indivíduos, organizaçõ­es e mesmo governos”, diz Emilio Ferrara, pesquisado­r da Universida­de da Califórnia — ele constatou que 1 em 5 postagens política nas eleições americanas vinha de robôs.

Bolsonaro diz não ter relação com os tuitaços, mas os aprova. “A leitura que faço é a satisfação do dever cumprido”, diz. Seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) cuida do Twitter —ele mesmo só trabalha “com o Facebook, apenas”.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil