Médica é inocentada em caso de UTI do PR
Virgínia de Souza foi acusada de ‘antecipar a morte’ de sete pacientes no Hospital Evangélico de Curitiba de 2011 a 2013
Ex-chefe da UTI sempre alegou inocência; agora a Promotoria recorrerá com um pedido de júri popular para a médica
A médica Virgínia Helena Soares de Souza foi inocentada da acusação de matar sete pacientes, de 2011 a 2013, na UTI do Hospital Evangélico de Curitiba. O Ministério Público vai recorrer da decisão.
Ela, ex-chefe da UTI, havia sido indiciada por homicídio doloso duplamente qualificado por “antecipar a morte” (eutanásia) dos doentes.
A decisão foi dada nesta quinta (20) pelo juiz Daniel Surdi de Avelar, que também inocentou os médicos Edison Anselmo da Silva Júnior, Maria Israela Cortez Boccato e Anderson de Freitas e as enfermeiras Laís da Rosa Groff e Patrícia Cristina de Goveia Ribeiro, que também trabalhavam na mesma unidade.
O Conselho Regional de Medicina do Paraná já havia inocentado os médicos.
Além das mortes, todos os acusados também respondiam pelo crime de formação de quadrilha, com violação de deveres inerentes à profissão.
Sobre a recente decisão da Justiça, segundo os promoto- res do Estado, foram privilegiados depoimentos de testemunhas de defesa em detrimento de laudos do IML. Os promotores dizem ainda que, nos diálogos entre os réus gravados com autorização da Justiça, fica clara a intenção de provocar as mortes.
Em nota, o órgão afirma que o caso deve ser levado a júri popular, pois “há provas da existência de homicídios e evidências suficientes de autoria”. Eles já haviam pedido em outubro do ano passado que o caso fosse a júri popular, mas a Justiça negou.
“Não visualizo suficientes indícios de autoria para a prática dos supostos crimes narrados na denúncia aptos a submeter os acusados a júri popular. Não restou satisfatoriamente demonstrado que os acusados praticavam antecipações de óbitos, seja por questões técnicas, atinentes à medicina, seja pela tênue prova testemunhal nesse sentido”, afirmou o juiz na decisão.
A promotora de Justiça Fernanda Nagl Garcez afirmou que respeita a decisão do juiz, mas ela não levou em consideração “o conjunto das provas, principalmente a prova documental e o prontuário dos pacientes”.
O advogado da médica, Elias Mattar Assad, disse que o juiz acertou ao não levar o caso a júri popular. “Não tínhamos um fato criminoso. Exercer medicina intensiva não é crime e falamos [isso] desde o início”, afirmou em entrevista nesta sexta-feira (21).
Assad disse que o perito se deixou “inebriar pelas luzes do caso” e ficou tentado a dar opiniões. “Quarenta médicos depuseram no caso. Todos eles estariam errados? O CRMPR estaria errado? O juiz julgou errado? Todo mundo está errado?”, argumentou.
A promotora, por sua vez, disse que a maioria dos médicos ouvidos ainda trabalha no hospital e não tem a isenção necessária para analisar o caso tecnicamente.
O advogado contou que deu a notícia em primeira mão para a médica. “Segurei nas mãos dela e falei da sentença do juiz. Os olhos dela se encheram de lágrimas.”
Assad disse que a médica perdeu praticamente tudo o que tinha e que agora mora com o filho. A defesa informou que vai entrar uma ação contra o Estado. “Não se pode ‘desacontecer’ o que já aconteceu. Não há dinheiro no mundo que devolva para alguém o que ela perdeu.”
Assad também disse que entrará com ação por danos morais. Virgínia já havia ganhado ação na Justiça do Trabalho contra o hospital, no valor de R$ 4 milhões. “Foi por questões trabalhistas, mas o hospital tem uma fila para pagar”, disse o advogado. CASO Os episódios suspeitos vieram à tona em 2013, após investigação da Polícia Civil.
Segundo a denúncia do Ministério Público, os acusados agiram juntos para terminar com a vida de pacientes internados na UTI, sob o comando de Virgínia.
Eles, supostamente, prescreviam certos medicamentos que, aliados à redução dos parâmetros de ventilação, levavam pacientes à morte. Os atos teriam como objetivo a liberação dos leitos na unidade de terapia intensiva.
Virgínia chegou a ser presa em fevereiro de 2013, sendo solta um mês depois. Em um manifesto divulgado naquele mês, ela afirmou que sofria “o maior erro investigativo e midiático da nossa história”. A médica sempre negou as acusações.