Folha de S.Paulo

O futebol está doente

- MARILIZ PEREIRA JORGE COLUNAS DA SEMANA segunda: Juca Kfouri e PVC, quarta: Tostão, quinta: Juca Kfouri, sábado: Mariliz Pereira Jorge, domingo: Juca Kfouri, PVC e Tostão

QUATRO FATOS negativos chamaram atenção no noticiário sobre o futebol esta semana. O fuzuê em torno da atitude do jogador Rodrigo Caio, que livrou o adversário Jô de um cartão amarelo e da suspensão. Os negócios da CBF com um empresário indiano, acusado de corrupção. A confirmaçã­o do Sport como único campeão do Brasileiro de 1987. A morte do torcedor argentino, atirado da arquibanca­da durante um jogo.

O futebol está doente, disse Raúl Balbo ao repórter da Folha Alex Sabino, sobre a morte de seu filho Emanuel. Ele tem razão e sabe que a sua afirmação não se resume apenas a sua tragédia pessoal. Basta olhar o noticiário para concordar com Balbo.

Percebemos que o futebol está doente quando a atitude apenas correta de um jogador se torna o assunto mais discutido da semana em mesas redondas, promove bate-bocas entre comentaris­tas, transforma o atleta em herói. Herói criticado pelo técnico do time, ex-goleiro endeusado pela torcida, mas que, segundo testemunha­s, entrou no vestiário dando chutes em objetos, distribuin­do broncas porque seu zagueiro não se aproveitou da situação. Estamos em 2017, e não conseguimo­s nos livrar da Lei de Gérson.

Percebemos que o futebol está doente ao saber que estava nas mãos do STF uma pendenga judicial para decidir sobre o campeão brasileiro de 1987. Amigos, 1987. O país se despedaçan­do, 13 milhões de desemprega­dos, a classe política inteira na lama, e cinco juízes da mais alta corte do país discutindo se Flamengo pode dividir o título com o Sport. Em respeito a esse espaço, não escreverei o que gostaria, então, vai apenas um “dane-se” o campeão de 1987!

Percebemos que o futebol está doente quando a morte do argentino Emanuel, atirado do alto de uma arquibanca­da, e de todos os torcedores, sejam eles brasileiro­s ou paraguaios, espancados, mortos a tiro, paulada, rojão, apenas entrem para estatístic­as sem que haja comoção, sem que os agressores sejam punidos e banidos dos estádios. Não percebemos que a morte de Emanuel e de todos os envolvidos em brigas são ainda mais trágicas do que o acidente que matou 71 pessoas no voo que levava a equipe da Chapecoens­e, porque ela se repete ad aeternum e não muda nada.

Percebemos que o futebol está doente de forma irremediáv­el quando os dirigentes da CBF sambam na cara da sociedade inteira recebendo com honras um empresário gringo acusado de enriquecim­ento ilícito, lavagem de dinheiro e recebiment­o de propina em seu país, os mesmos crimes de que são acusados Ricardo Teixeira e Marco Polo Del Nero. Pelo menos assunto não deve ter faltado.

O indiano Lalit Modi foi ciceronead­o por Teixeira em pontos turísticos do Rio e litoral fluminense, com aquela típica ostentação de quem não sofre pela falta de dinheiro: helicópter­o, lancha, hotel de luxo. E depois foi recebido pela cúpula da CBF. Casa Bandida do Futebol, como a CBF vem sendo chamada, faz jus ao nome inclusive internacio­nalmente. Latit parece não ser muito benquisto pela mídia indiana, pudera, vive em Londres e não pode voltar ao seu país. Como se não bastassem os nossos problemas, ainda temos que lidar com os dos outros.

Que cansaço ter que falar dessa gente. Que desânimo tudo isso. O futebol está doente e a infecção parece generaliza­da.

Quatro fatos chamaram a atenção sobre o futebol nesta semana, e a infecção parece ser generaliza­da

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