Partido Socialista de Hollande se vê diante de derrota esmagadora
Governo impopular do atual presidente francês sepulta as chances do candidato Benoît Hamon
Declínio da sigla se insere no contexto de derrocada da centroesquerda europeia, afirmam analistas
A incerteza em torno desta eleição presidencial na França é inédita. Um fato parece, no entanto, incontestável: o Partido Socialista, hoje no governo, acordará nesta segunda-feira (24) com um gosto azedo na boca.
Seu candidato, Benoît Hamon, deve chegar em quinto lugar, com apenas 7,5% dos votos, segundo pesquisa Ipsos publicada na sexta (21).
A impopularidade do partido é tamanha que o presidente François Hollande decidiu nem concorrer à reeleição —ele tem a pior aprovação no cargo desde a Segunda Guerra (1939-1945). Essa é a primeira desistência a uma reeleição desde 1958.
“É o fim de uma era”, afirmaà Folha o cientista político Jean-Yves Camus. “O Partido Socialista terá que começar uma nova etapa e se reconstruir de baixo para cima. Vão começar do zero.”
Já há manobras na sigla, segundoojornal“LeMonde”, para redefinir seus rumos após esta derrota. Hamon foi prejudicado, em comparação aos outros dez candidatos, porque precisou justificar em sua campanha as ações do impopular governo, que ele representa no palanque.
“É uma tarefa difícil quando ele fala com a classe trabalhadora, que ressente qua- se tudo o que Hollande disse que ia fazer e não fez”, diz.
Uma das principais decepções do eleitorado socialista foi a promessa, não cumprida, de acabar com o desemprego até o fim do mandato —a taxa está em 10% hoje. “Quem não tem emprego está enraivecido”, diz Camus.
Eleitores migraram ao centrista Macron, atraídos pela promessa de liberalismo econômico, e ao extremista de esquerda Jean-Luc Mélenchon, convencidos por suas propostas, como uma redução da jornada de trabalho.
Mesmo líderes socialistas abandonaram o partido. Manuel Valls, que foi primeiroministro do governo Hollande, anunciou apoio a Macron, enfurecendo a sigla e agravando divisões internas. Valls foi derrotado por Hamon nas primárias socialistas.
A própria candidatura de Macron foi lançada com o apoio do prefeito socialista de Lyon, Gérard Collomb. “Ele estava muito desapontado com o governo de Hollande e entendeu que Macron poderia ser presidente”, diz Arthur Empeureur, 26, assessor político de Collomb.
Hamon é desfavorecido também por uma tendência regional. Os partidos de centro-esquerda estão sendo punidos nas urnas em toda a Europa. Na Espanha, o tradicional PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol) amargou seu pior resultado em 2016. “Há algo de errado com a social-democracia”, diz Camus. “Seus candidatos não conseguem mais falar com a classe trabalhadora, porque ela já não existe como tal. Não há mais sentimento de classe. A centro-esquerda parece falar apenas com os vencedores da globalização.”
Eleitores tampouco estão satisfeitos com o desempenho dos Republicanos, de centro-direita, e a desconfiança em relação aos partidos tradicionais é atestada pela força de candidatos vindos dos extremos políticos.
Marine Le Pen, de extrema direita, e Jean-Luc Mélenchon, de extrema esquerda, disputam neste domingo a concorrida vaga ao segundo turno das eleições —à qual Hamon já não é mais cotado.
Ele também carece, segundo cientistas políticos, de liderança. O ex-ministro da Educação não tem, afirma Bruno Cautrès, do Sciences Po, o “perfil de um grande chefe para o Executivo”.
Ele representa um Partido Socialista que teria guinado demasiado à direita, já que Hollande não é mais visto como um presidente de esquerda “com sua proposta de retirar a dupla nacionalidade de suspeitos de terrorismo e seu apoio à reforma trabalhista”, diz Cautrès. (DIOGO BERCITO) dos inscritos moram no exterior (14 mil no Brasil); eles votam no sábado devido ao fuso horário locais de votação na França (3h de Brasília) é o horário de abertura das urnas (15h de Brasília) é o horário de fechamento