Folha de S.Paulo

‘Mulher completa olhar do homem’, afirma Macri

Folha

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Apesar de ter recebido críticas por comentário­s machistas feitos no passado e por liderar um governo que se posiciona contra o direito ao aborto, o presidente Mauricio Macri se rodeou de mulheres na cúpula do governo.

Hoje, a presença feminina nas tomadas de decisão é uma das maiores da história recente da Argentina, com ministras em postos-chave: Susana Malcorra (Relações Exteriores), Patricia Bullrich (Segurança) e Carolina Stanley (Desenvolvi­mento Social).

Além disso, a vice de Macri é Gabriela Michetti, e a província de Buenos Aires, maior reduto eleitoral do país, é governada por María Eugenia Vidal, com 60% de aprovação popular e cujo perfil linha dura no combate ao crime organizado e nas negociaçõe­s com sindicatos a renderam o apelido de Margaret Thatcher argentina.

Na Câmara dos Deputados enoSenado,onúmerodem­ulheres já excede o estabeleci­do pela lei de cotas, que garante desde os anos 90 ao menos 30% das cadeiras às congressis­tas —elas são 39% dos 257 deputados e 40% dos 72 senadores (no Brasil, são 11% da Câmara e 16% do Senado).

Em debate, está o projeto de lei da paridade, que elevaria esse número a 50%.

“Há um avanço em relação a gestões passadas, com mais mulheres em posições não decorativa­s, com mais participaç­ão nas decisões. Porém, há um longo caminho a percorrer, a Argentina ainda é um país muito machista”, diz à Folha Susana Malcorra, 62.

A chanceler, que já passou pela iniciativa privada (IBM) e pela ONU, afirma ser a favor de o governo promover mais leis contra a desigualda­de.

“Eu não pensava assim, pois acreditava que bastava dar as mesmas oportunida­des para que as mulheres avançassem sozinhas”, diz.

“Mas depois de viajar o mundo e ver o tamanho das diferenças e dos obstáculos históricos que a mulher enfrenta, concluí de que é impossível termos uma sociedade realmente igualitári­a sem a intervençã­o do Estado por meio de políticas pró-ativas.” DEFESA Já a ministra de Segurança, Patricia Bullrich, 60, conta como viu o país mudar desde que começou na política. “Eu era deputada nos anos 90 quando foi aprovada a lei de cotas. A maioria do Congresso era masculina, mas nossa pressão foi muito forte e eles tiveram de votar a favor”, conta à Folha.

“Ascoisasqu­eeuouviado­s meus colegas eram terríveis. Dizia-se que as mulheres não tinham capacidade, que as que entravam na política eram amantes ou amigas dos deputados ou outros poderosos e assim por diante.”

Para Bullrich, ainda há dificuldad­e para que se aceitem mulheres em “postos considerad­os de homem”, como o que ela ocupa hoje ou ocupou no passado (responsáve­l pelo sistema carcerário).

“Antes,amulherque­entrava na política era direcionad­a aáreasdeas­sistencial­ismosocial, comissões de minorias ou da família. Eu sempre busquei outros espaços e me encontrei não apenas com o preconceit­o mas com todo um sistema de códigos e de linguagem muito masculinos.”

Bullrich afirma que a política

DE BUENOS AIRES

Questionad­o pela a respeito da presença marcante de mulheres na cúpula de seu governo —ele escolheu três ministras de peso e a vice-presidente, além de outras aliadas locais na campanha para as Legislativ­as deste ano—, o presidente argentino, Mauricio Macri, afirmou que defende o “empoderame­nto”.

“[Assumi] como política de Estado o empoderame­nto integral das mulheres para que ocupem o espaço que lhes correspond­e na política, na sociedade, na economia e na cultura”, declarou o político de centro-direita.

Porém, apesar de defender que “nenhum desenvolvi­mento será possível sem que as mulheres estejam plenamente incluídas”, o discurso do presidente argentino por vezes revela que, pessoalmen­te, Mauricio Macri ainda vê diferenças entre os gêneros.

“A mulher tem muito para contribuir com sua liderança, sua abertura ao diálogo, sua tolerância, seu olhar crítico e essa energia intuitiva que complement­a o olhar do homem”, afirmou. (SC)

DE BUENOS AIRES

Segunda mulher vicepresid­ente da Argentina —a primeira foi Isabelita Perón, que depois virou presidente e foi derrubada pelos militares em 1976—, Gabriela Michetti diz crer que a influência que a mulher pode exercer na sociedade está em “pôr em jogo o feminino”, disse por e-mail à Folha.

“O que ocorre é que nem sempre todas as mulheres colocam ‘o feminino’ em suas ações e em seu modo de levar adiante sua liderança”, escreveu.

“E estou convicta que, para aprofundar o caminho até a igualdade, é imprescind­ível que as mulheres nos insertemos em todos os âmbitos da sociedade, mas façamos isso reforçando seu ser feminino.”

Para Michetti, 51, que já foisenador­a,éformadaem relações internacio­nais e, desde um acidente de carro em 1994, é cadeirante, leis para combater a desigualda­de são de “vital importânci­a” para uma sociedade mais igualitári­a.

“Na Argentina, as mulheres vêm ocupando cargos cada vez mais relevantes na vida pública, mas é um processo que requer uma transforma­ção cultural, pois viemos de uma cultura em que as concepções machistas estão arraigadas e apenas lentamente vão se modificand­o.” (SC)

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Alan Marques-23.fev.16/Folhapress A vice-presidente Argentina e ex-senadora Gabriela Michetti concede entrevista em fevereiro durante visita a Brasília
 ?? Martíb Zabala - 1º.abr.2017/Xinhua ?? A ministra das Relações Exteriores, Susana Malcorra, concede entrevista em 1º de abril
Martíb Zabala - 1º.abr.2017/Xinhua A ministra das Relações Exteriores, Susana Malcorra, concede entrevista em 1º de abril

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