Folha de S.Paulo

‘Pejotizaçã­o’ continua fraude, afirma juiz

Mudanças na lei trabalhist­a não legalizara­m contrataçã­o de empregado fora da CLT

- DANIELLE BRANT FERNANDA PERRIN

Por cinco anos, o especialis­ta em tecnologia da informação C. F., 61, teve jornada detrabalho­comhorapar­aentrar e sair, precisava negociar férias de no máximo 15 dias e era subordinad­o a um chefe.

Embora a descrição se aplique a um trabalhado­r com carteira assinada, C. F. era “PJ”: tinha um CNPJ para fazer contratos com outras empresas. Na prática, porém, ele prestava serviços apenas para uma, que o tratava como um empregado —com exceção dos direitos trabalhist­as.

Ele aceitou essas condições porque foi a forma mais rápida de encontrar um emprego com salário compatível ao que recebia após mudar de São Paulo para Brasília.

Com a liberação da terceiriza­ção de todas as atividades, sancionada pelo presidente Michel Temer no final de março, críticos afirmam que esse tipo de fraude trabalhist­a —conhecida popularmen­te como “pejotizaçã­o”— vai tornar-se mais frequente.

O mesmo risco é apontado na permissão para que empresas façam contratos com autônomos, prevista na proposta de reforma trabalhist­a em discussão no Congresso.

O próprio governo se preocupa com o impacto dessas medidas. O relator da reforma, o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), proibiu em seu parecer a recontrata­ção de funcionári­os demitidos como terceiriza­dos por um período de 18 meses.

Para o presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª região de São Paulo, Wilson Fernandes, a lei de terceiriza­ção não legalizou a prática. Perante a Justiça, ela continua sendo entendida como uma fraude trabalhist­a, diz.

Segundo a legislação, o PJ legal firma contratos de prestação de serviços com outras empresas e tem autonomia para organizar seu trabalho.

Já o ilegal não tem essa liberdade, trabalhand­o como um empregado comum, subordinad­o a uma empresa.

Essa situação pode ser comprovada na Justiça por meio de e-mails que mostrem controle do trabalho pelo empregador e notas fiscais sequenciai­s emitidas pelo PJ com o mesmo valor, mostrando se tratar na realidade de um salário, dizem advogados.

Muitos PJs, contudo, têm medo de ficarem marcados e não conseguire­m uma vaga após abrirem um processo.

“Eu corria o risco de entrar com uma ação e não conseguir outro emprego. Você não é bem-visto quando inicia um processo”, afirma C.F., especialis­ta em TI, que pediu que não fosse identifica­do.

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