Mercado. “Mais pessoas passaram a saber que têm o problema e se tornaram potenciais consumidores”, diz.
DE SÃO PAULO
Criar um negócio a partir de necessidades pessoais pode parecer uma ideia brilhante. Entretanto, a empolgação em ver um problema resolvido —e a possibilidade de lucrar com a solução— pode ser maior do que a realidade do mercado consumidor.
“O apelo é grande nas áreas de saúde, alimentação e infraestrutura, ramos em que o empreendedor sente na pele a falta do serviço e vai atrás para fornecê-lo de qualquer jeito”, diz Rafael Ribeiro, diretor-executivo da Associação Brasileira de Start-ups.
É nesse ímpeto, diz Ana Fontes, diretora da Rede Mulheres Empreendedoras, que o empresário mais erra. “Ele fica cego, não estuda direito o mercado e acha que muita gente pode ter a mesma necessidade dele. E não é bem assim”, afirma.
O norte-americano naturalizado brasileiro Thomas Case, 79, soube o que fazer antes de investir em uma solução para seu problema de dores constantes nos pés.
Ex-proprietário da empresa de recrutamento Catho, Case criou a Pés sem Dor, que faz palmilhas personalizadas para tênis, sapatilhas e calçados de salto alto. As atividades começaram em 2008.
O empresário buscou pesquisas sobre seu problema e também dados sobre longevidade, já que o público-alvo do empreendimento é a população mais velha.
As palmilhas, de elastômero (borracha sintética), são feitas sob medida. Os pés dos clientes são escaneados, e as imagens servem para moldar os produtos em uma impressora 3D. Todo o atendimento é feito por uma equipe de 16 fisioterapeutas.
Cada par custa R$ 780. Para crescer, Case tem buscado parcerias com clínicas de ortopedia. “Hoje, apenas 6% dos clientes se dizem insatisfeitos e pedem devolução do dinheiro”, diz o empresário. APÓS CIRURGIA Em 2012, a empresária carioca Vanessa Medeiros, 35, retirou um nódulo de 10 centímetros do intestino. Após o procedimento, seu organismo deixou de produzir as enzimas que digerem alimentos com glúten e leite de origem animal.
“Eu olhava as prateleiras dos mercados e não achava nada seguro. Mesmo os produtos sem glúten informavam na embalagem que poderia haver traços da substância”, afirma Medeiros.
Ela investiu os R$ 230 mil que havia poupado com o marido e lançou em 2016 a Manjerico, fábrica de pães e doces para consumidores com a mesma intolerância.
Segundo a empreendedora, o desenvolvimento de exames que detectam intolerância alimentar fomentou esse ACOMODAÇÃO Para Elisabete Fernandes, consultora do Sebrae-SP, o mercado sempre vai se expandir para atender demandas pontuais. “Mas é obrigação do empreendedor não ficar restrito apenas a uma solução voltada para um consumidor muito específico.”
O casal Edgar Aires, 39, e Jussara Ferreira, 36, de São Paulo, adiou o sonho do próprio negócio por duas vezes. A primeira tentativa frustrada foi a de uma panificadora.
ELISABETE FERNANDES
consultora do Sebrae-SP Na segunda empreitada, a fábrica de sorvetes veganos também não prosperou. O motivo para ambos os casos: falta de cozinha industrial.
O casal focou em sua própria dificuldade e mudou a estratégia: montou uma cozinha compartilhada para empresários que estão começando no ramo alimentício, mas que não têm estrutura.
O Oficina da Mesa tem porte para até três produções simultâneas de alimentos. O faturamento de R$ 8.000 por mês vem do aluguel do espaço. A hora custa, em média, R$ 75. “Agora queremos fazer da cozinha um programa de treinamento para novos empreendedores”, diz Aires.
A Pés sem Dor também tem planos de expansão. Quer abrir um ponto próprio por mês —hoje são sete— e também chegar ao consumidor industrial. “O trabalhador da indústria fica muito tempo em pé e sente muitas dores.”
A Manjerico já atua no varejo e se prepara para vender brigadeiros sem lactose ou glúten na rede supermercadista Zona Sul, do Rio.
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É obrigação do empreendedor não ficar restrito apenas a uma solução voltada para um consumidor muito específico
Três pontos que devem ser considerados antes de transformar uma necessidade pessoal em negócio