Comediantes evitam humor ligeiro em ‘Mulheres Ácidas’
FOLHA
Virgindade, telenovela, astrologia: sobre o que mais uma peça inspirada no universo feminino tem a dizer em 2017?
“Mulheres Ácidas” engana o olho ao colocar essas e outras convenções em perspectiva. O espetáculo amarra quatro histórias intermitentes em convívios breves ou continuados.
A dramaturgia de Cristiane Wersom combina riso e insights em termos de intimidade, comportamento e amenidades. Diálogos e narrações lembram o estilo aparentemente descompromissado de Domingos Oliveira nas confissões e “feminices” adolescentes, balzaquianas e quarentonas. A ótica da autora e intérprete, porém, considera nuances reflexivas que a visão masculina não alcança com tanta propriedade.
Cristiane joga com Marianna Armellini da primeira à última cena, parceiras de mais de década no palco, na internet e na televisão.
A química das comediantes é um trunfo. Elas evitam os cacoetes do humor ligeiro dos canais digitais. Interagem firme para comunicar a textura da obra.
Assumem brechas tragicômicas e existenciais sob a lógica de que menos pode ser mais. Filosofia essencial na direção de Cristiane Paoli Quito, adepta de poucos elementos sobre o tablado e sábia nas correlações corpo/espaço.
A acidez não significa, necessariamente, atitude de rechaço. As insubmissas Marianna e Cristiane levam um bocado das gerações passadas e presentes representadas em suas convicções e incertezas. QUANDO ter. e qua., às 21h; até 3/5 ONDE teatro Eva Herz - Livraria Cultura, av. Paulista, 2.073, tel. (11) 3170-4059 QUANTO R$ 40; 14 anos AVALIAÇÃO bom
“Sex with Strangers” figura há dois anos entre as peças mais encenadas nos EUA, com sete novas produções por temporada. Estreou em 2011, em Chicago, mas só virou fenômeno ao chegar a Nova York em 2014. Por causa dela, a autora Laura Eason foi convidada e se tornou roteirista —e agora produtora— da série “House of Cards”.
Vendo a montagem brasileira, que recebeu o título canhestro de “Estranhos.com”, é difícil compreender o que levou a tanto. Diferente de “Closer”, por exemplo, peça que causou febre semelhante há exatos 20 anos com temas parecidos, suas premissas são difíceis de aceitar.
Para um drama realista, soa falso e kitsch uma pousada no meio do nada, sem conexão com o resto do mundo, onde se encontram dois escritores também implausíveis.
Ela, uma talentosa autora próxima dos 40 anos que desistiu da carreira quando seu primeiro livro passou injustamente despercebido, por causa de uma capa equivocada. Ele, um blogueiro de 20 e poucos anos que coletou em livro seus posts sobre experiências sexuais abusivas com desconhecidas —e há cinco anos é um best-seller.
A dicotomia se espalha por todo lado, ao contrário de “Closer”. Também diferente é a maneira como as referências tecnológicas envelheceram rápido demais.
O jogo de identidades sexuais on-line da peça de Patrick Marber sobrevive; já o universo de blogs e e-books de Laura Eason ficou pelo caminho, na curta trajetória de seu texto. Muito dele gira em torno da promessa ou ameaça do livro eletrônico —que não aconteceu, como a própria Amazon admite: seus e-books não fizeram com os livros impressos o que o Spotify fez com os CDs.
A encenação brasileira parece ter optado por enfatizar a tecnologia e uma certa camaradagem em cena, tirando sexo até do título. O efeito é acentuar o puritanismo na relação, esfriando o conflito.
Não falta sensualidade aos atores Deborah Evelyn e Johnny Massaro, mas ela é pouco explorada. A relação que os seus personagens desenvolvem no palco é quase maternal —ou filial.
Ela o guia para se tornar um escritor e ser humano melhor. Ele mostra que ela pode retomar a carreira, que tem talento, sim. Os dois parecem incapazes de desejar mal um ao outro, só agem errado por QUANDO sex., às 21h30; sáb., às 21h; dom., 18h; até 14/5 ONDE Teatro Vivo, av. Doutor Chucri Zaidan, 2.460, tel. (11) 97420-1520 QUANTO R$ 60 a 80; 14 anos AVALIAÇÃO regular da Fonseca é o convidado do programa de debates, no qual falará sobre a situação política e econômica do Brasil e responderá perguntas sobre as reformas defendidas pelo governo Temer. Cultura, 22h15, Livre