Folha de S.Paulo

Clube novo

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A Operação Lava Jato mal existia quando o principal clube de democracia­s industrial­izadas, a OCDE, publicou seu relatório de 2014 sobre a Convenção de Combate ao Suborno. “Preocupa a passividad­e e a falta de esforço investigat­ivo do governo brasileiro”, concluía o texto.

O relatório ainda oferecia 39 recomendaç­ões práticas para melhorar a capacidade investigat­iva do Estado, dificultan­do a vida de quem repassa envelopes pardos no estrangeir­o em troca de contratos gordos de infraestru­tura, regados com dinheiro público.

De lá para cá, muita coisa melhorou. Recém-publicado, o novo relatório da OCDE mostra que 31 das recomendaç­ões feitas há três anos já foram implementa­das. Mas a grande notícia é outra.

O Palácio do Planalto prepara um pedido de acesso do Brasil à categoria de membro pleno da OCDE, um processo complexo e de resultado incerto (Argentina e Colômbia já tentaram, sem êxito).

Para aceder ao clube, o Brasil terá de fazer ajustes em seus marcos regulatóri­os em áreas como transparên­cia, competição e prestação de contas. Tornou-se imperioso fazer isso porque a corrupção endêmica e a Nova Matriz Econômica deixaram um estrago de longo prazo nas contas públicas, nas políticas sociais e na imagem internacio­nal do país.

Virando membro permanente da OCDE, o Estado brasileiro adotará padrões de conduta e controle democrátic­o mais sofisticad­os do que existem hoje. Para uma sociedade tão integrada à economia global e tão sedenta de limpeza como a nossa, isso fará toda a diferença.

As normas da OCDE dão força renovada a quem quer modernizar a política brasileira. Quando aderimos à convenção do clube sobre tributação, por exemplo, o fisco conseguiu repatriar as fortunas escondidas por nossos maganos na Suíça e em outros paraísos fiscais.

Assim, a adesão à OCDE é uma excelente notícia para o cidadão brasileiro. A soberania nacional permanece intacta, mas o custo da falcatrua fica um pouco mais elevado para os grupos de interesse que capturaram o Estado. A reforma necessária será mais rápida e eficaz se estivermos dentro do grupo.

A oposição denunciará esse processo como rendição aos ditames dos países centrais. Dirá ser burrice um governo autolimita­r seu próprio campo de ação, perdendo autonomia por meio de amarras formais. O general Médici argumentou o mesmo quando rejeitou compromiss­os internacio­nais de direitos humanos e não proliferaç­ão nuclear. Deu no que deu: um país mais injusto, empobrecid­o e cínico.

A OCDE não resolverá nossas mazelas, pois a solução terá de ser encontrada em casa, mas será um instrument­o útil na tarefa árdua de tirar a democracia brasileira da lama em que se encontra.

MATIAS SPEKTOR

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