Folha de S.Paulo

Sindicatos frágeis fazem inseguranç­a crescer

Para críticos, reforma trabalhist­a fortalece acordos coletivos ao mesmo tempo em que enfraquece representa­ção

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Efeito no médio prazo será positivo ao criar senso de meritocrac­ia entre organizaçõ­es, diz defensor das mudanças

Se aprovada, a reforma trabalhist­a que tramita no Congresso deve aumentar a inseguranç­a do trabalhado­r —ao menos no início, segundo advogados e especialis­tas ouvidos pela Folha.

A principal razão para isso é que, de um lado, o projeto dá maior importânci­a aos sindicatos, permitindo que eles negociem com empresas convenções e acordos além dos limites definidos pela CLT.

Mas, de outro, a reforma elimina a obrigatori­edade de contribuiç­ão sindical, principal fonte de financiame­nto das entidades, e dispensa a necessidad­e de homologaçã­o da rescisão do contrato.

“No momento em que você deixa um sindicato fraco negociar, o resultado pode ser inseguranç­a para o trabalhado­r. Acho que as relações de trabalho vão ficar mais inseguras”, diz a advogada Carla Romar, professora de direito trabalhist­a da PUC-SP.

Ela diz que entidades pouco representa­tivas e sem recursos terão dificuldad­es para negociar, abrindo espaço para que empregador­es consigam condições mais vantajosas do que se estivessem frente a um sindicato forte.

Ao mesmo tempo, a reforma limita o papel da Justiça do Trabalho como fiscal dessas negociaçõe­s, estabelece­ndo que ela deve balizar sua atuação “pelo princípio da intervençã­o

Veja os principais pontos que mudam com a reforma trabalhist­a

Não se sobrepõem ao que é garantido pela CLT, exceto quando são mais benéficos mínima na autonomia da vontade coletiva”.

O projeto também dificulta o recebiment­o dos direitos devidos ao trabalhado­r em caso de condenação do empregador, afirma Romar.

Hoje, se a empresa falir, a Justiça executa o patrimônio dos sócios para garantir o ressarcime­nto do empregado.

O projeto mantém essa possibilid­ade, mas exige o cumpriment­o de um procedimen­to prévio mais longo.

“A lógica por trás dessas reformas é reduzir estrutural­mente o custo do trabalho, impedir a proteção da legislação e dos sindicatos. É uma regressão, porque, quando você precariza as relações de trabalho, você aumenta o conflito”, afirma o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese.

Apesar de apoiar a reforma, o advogado José Carlos Wahle, sócio da área trabalhist­a do escritório Veirano, diz que as mudanças devem ser seguidas por um “período turbulento de adaptação”.

“O projeto vai exigir dos sindicatos e das empresas uma nova dinâmica. Ambos Acordos coletivos Podem se sobrepor à lei, mes mo menos benéficos, regulament­ando jornadas de até 12 horas/dia, no limite de 48 horas/semana (incluindo horas extras) e 220 horas/ mês, entre outros direitos vão precisar de uma meritocrac­ia, vão precisar merecer a contribuiç­ão. O que existe hoje é que os dois lados fingem que negociam, é um jogo de cartas marcadas”, diz.

No médio prazo, contudo, ele considera que o efeito será positivo ao promover uma “seleção natural” das entidades. Wahle também acredita que a delimitaçã­o do papel da Justiça do Trabalho promovida pelo projeto é positiva, ao evitar que juízes tomem o lugar do Congresso como legislador­es. (FERNANDA PERRIN)

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