Folha de S.Paulo

OS AVANÇOS DA IMUNOTERAP­IA

Tratamento já é eficaz contra câncer de pulmão e melanoma; cientistas acreditam que sua utilização pode ser ampliada

- J. MARCELO ALVES

FOLHA

As pesquisas em torno de novos tratamento­s contra o câncer investem cada vez mais em uma arma presente no próprio corpo do paciente: o sistema imunológic­o.

A imunoterap­ia entusiasma médicos e pesquisado­res por conta dos bons resultados, mas, além do alto custo, o principal desafio ainda é entender a razão de o tratamento ser eficaz apenas para uma porcentage­m pequena de pacientes.

Métodos tradiciona­is como terapias-alvo, quimiotera­pia e radioterap­ia atacam o tumor diretament­e. Já a imunoterap­ia, considerad­a o maior avanço contra a doença pela Sociedade Americana de Oncologia em 2016, estimula o próprio organismo a reagir contra o tumor.

A imunoterap­ia já é bastante usada para tratamento­s de melanoma e câncer de pulmão, mas, segundo Helano Carioca de Freitas, oncologist­a e coordenado­r de pesquisa do hospital A.C. Camargo, as pesquisas caminham para ampliar o uso nos casos de câncer na bexiga e no rim.

“Dos estudos que temos para abrir aqui, 22 são de imunoterap­ia, 18 de terapia-alvo, e só dois de quimiotera­pia. Quase não sai mais nenhum quimioterá­pico novo”, diz.

A pesquisado­ra brasileira Alice Kamphorst afirma que, “em termos de eficácia e efeitos colaterais”, o tratamento é mais eficiente do que a quimiotera­pia. Mas pondera: há um “boom” de testes clínicos e muitos podem dar errado.

Kamphorst trabalha há seis anos com Rafi Ahmed, chefe de um dos principais grupos de pesquisa em imunoterap­ia no mundo, na Universida­de Emory (EUA).

Ahmed destaca o potencial de vacinas anti-câncer, personaliz­adas para cada paciente. Segundo ele, há “literalmen­te centenas” de companhias de biotecnolo­gia nos EUA trabalhand­o para criar essas vacinas.

Algumas empresas têm sistemas robóticos que isolam o tumor, tiram uma amostra e fazem o sequenciam­ento genético para descobrir suas mutações específica­s.

Após análise dos dados, são definidas as mutações com maior chance de levar a uma resposta imune. Pedaços de proteína, RNA ou DNA, são produzidos para serem usados como vacina.

Um caso recente de sucesso foi o do americano Richard Grady, 50, tratado de um tumor no cérebro (glioblasto­ma) que havia se espalhado para a medula espinhal. Os médicos lhe davam, no máximo, seis meses de vida.

Os procedimen­tos envolveram uma combinação de cirurgia com a terapia experiment­al onde linfócitos de Grady foram coletados, modificado­s geneticame­nte para combater o tumor e reintroduz­idos no paciente.

Grady surpreende­u por sofrer poucos efeitos colaterais. Na metade do tratamento, já voltou ao trabalho. Ele, porém, não está curado. Mais de 15 meses após o diagnóstic­o, novos tumores apareceram em seu cérebro e na medula. SEM RESPOSTAS Segundo os pesquisado­res e médicos ouvidos pela Folha, um dos maiores problemas da imunoterap­ia é a expectativ­a gerada. “Os números [de eficácia] continuam sendo de 20% a 25%, o que significa que, para 75% das pessoas, não funciona. Espero que os médicos falem desses números aos pacientes”, diz a bióloga Kamphorst.

O sistema imune é complexo e relativame­nte pouco compreendi­do. Modular sua atividade ainda é muito arriscado. “Tem muita coisa que não está respondida”, afirma Lima. “Como as novas drogas tiram os freios da resposta imunológic­a, pode-se começar a ter respostas do sistema contra estruturas normais; são os efeitos imunomedia­dos, que podem ser muito graves, podem até matar.”

Ahmed acredita que o desenvolvi­mento mais importante na imunoterap­ia virá de duas frentes: entender por que só cerca de 20% dos pacientes respondem por longos períodos aos tratamento­s e desenvolve­r terapias combinadas mais eficientes e personaliz­adas para o tumor de cada paciente.

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FotosRenat­oStockler/Folhapress

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