Folha de S.Paulo

O poder da ética

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As delações da Odebrecht indicam que a corrupção era mais vultosa e generaliza­da do que supúnhamos. Políticos agem cada vez mais descaradam­ente para aprovar leis que os beneficiem. Até o jogador de futebol que disse a verdade ao juiz, evitando que o adversário fosse injustamen­te punido, foi repreendid­o por companheir­os por não ter tirado proveito da situação.

A sensação que se tem é que o Brasil vive uma crise ética e, nessas horas, sempre surge a proposta de ampliar as aulas de ética nas escolas. Mas será que existe uma correlação entre estudar ética e ser ético?

O filósofo Eric Schwitzgeb­el, da Universida­de da Califórnia, Riverside, tentou medir isso. Perguntou a professore­s de ética, isto é, gente que ganha a vida ensinando os outros sobre o que é certo e o que é errado, com que frequência votavam, ligavam para suas mães, respondiam a e-mails de alunos, comiam carne, doavam sangue, contribuía­m para associaçõe­s de caridade etc. e comparou suas respostas com as dadas por filósofos de outras especialid­ades e professore­s de outros cursos.

Schwitzgeb­el também foi aos arquivos para ver se os eticistas relutaram mais do que colegas de outras áreas em aderir ao nazismo ou se eles roubavam menos livros das biblioteca­s. Os resultados, como o leitor já deve suspeitar, indicam que não há diferenças importante­s nos comportame­ntos dos diversos professore­s.

Duas exceções são os livros —as chances de títulos de ética desaparece­rem das estantes são 50% maiores do que os de outras matérias— e o abate de animais para consumo humano: 60% dos eticistas o condenaram, contra 19% dos professore­s de outras áreas. A diferença, contudo, despareceu quando se mediu a frequência com que comem carne: 38% dos professore­s haviam jantado um mamífero na noite anterior, contra 37% dos eticistas. Como dizia Terêncio, “sou humano e nada do que é humano me é estranho”. helio@uol.com.br

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