Folha de S.Paulo

Posseiro teme voltar ao local da chacina

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DO ENVIADO A TAQUARUÇU DO NORTE (MT)

O local da chacina, em disputa entre posseiros e grileiros, é separada da agrovila pelo igarapé Pardo. Em dias secos, como o que a Folha esteve, é possível cruzá-lo a pé com a água na cintura. Mas basta uma chuva mais forte para deixá-lo intranspon­ível.

No dia seguinte à visita da reportagem, uma tempestade derrubou árvores sobre a estrada de 10 km entre a vila e o rio, que os posseiros percorrem em motos remendadas. Os peritos da Polícia Civil, de barco, levaram 3h para alcançar o mesmo ponto onde a Folha precisou de 1h.

O rio que demarca o conflito também salvou vidas. Moradores relatam que, por causa do nível alto do Pardo, 11 posseiros desistiram de atravessá-lo. Segundo os moradores, os assassinos não pouparam ninguém que encontrara­m na área disputada.

Nenhum morador permaneceu no palco da chacina. Nos locais onde foram achados os corpos, roupas ensanguent­adas ainda exalavam forte cheiro.

Um dos que escaparam foi o posseiro Abenis Pedro de Luna, 59. Com 101 hectares na área em disputa, ele costuma passar a maior parte do tempo ali, mas no dia do massacre estava na terra de um amigo.

“Agradeço muito o Tonho aqui, porque senão hoje eu estava frito”, diz Luna, que desde outubro de 2014 passou a morar na agrovila, depois que encapuzado­s incendiara­m todos os barracos da linha (estrada) 15, que atravessa a área em litígio. Foi ao longo da via que ocorreram os assassinat­os.

Luna é um dos mais antigos de Taquaruçu do Norte. Chegou em 2011, depois de trabalhar anos em serrarias, o que lhe decepou um dedo e o impede de fechar uma das mãos. Filho de agricultor­es, separado e pai, disse que essa é a sua primeira terra, onde planta em cerca de 3 hectares —o restante é floresta.

Um dos poucos posseiros ainda no local, disse que não sabe o que fará. “Quem vai lá agora? Eu não tenho coragem.” (FM)

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