Folha de S.Paulo

Rejeitada em Paris, candidata tem apoio não declarado em subúrbio rico

- RODRIGO VIZEU

Encontrar um eleitor de Marine Le Pen em Paris e disposto a abrir o jogo não é fácil.

“Tenho medo de ser reconhecid­a”, diz uma eleitora franco-portuguesa de Le Pen após desistir de dar entrevista. Mesmo para a imprensa brasileira? “Tenho um primo no Brasil, o Fernando”, desconvers­a.

A capital francesa deu apenas 5% dos votos do primeiro turno da eleição presidenci­al francesa à populista de direita, e 35% ao centrista Emanuel Macron —nacionalme­nte, ele obteve 24% dos votos, contra 21% dela.

Uma das poucas exceções ao mau desempenho de Le Pen na região parisiense é Coubron, onde a ultradirei­tista liderou com 26,7% dos votos, seguida do conservado­r católico François Fillon (20,4%), de Macron (20,1%) e do ultraesque­rdista Jean-Luc Mélenchon (18,4%).

Com clima de interior apesar de estar a 26 km do centro de Paris, Coubron é um subúrbio rico de menos de 5.000 ha- bitantes rodeado de municípios mais pobres e violentos.

“Tem imigrantes demais em volta”, lamuria-se uma aposentada de passo lento e mãos cheias de sacolas de feira. Ela se nega a revelar nome ou em quem votou ou votará, acrescenta­ndo apenas estar cansada dos arrombamen­tos de carros no vilarejo.

Mesmo numa cidade em que Marine Le Pen é líder a reportagem custou a achar quem admita votar nela.

O aposentado Jean-Pierre, que declina dar o nome completo, votou em Fillon e diz estar indeciso sobre quem escolherá neste domingo (7). Mas dá dicas, explicando que dará prioridade a quem reforçar o discurso de “valores”.

“As pessoas estão em buscas de um voto contestado­r. Estão dando essa eleição como certa, mas pode haver uma surpresa.”

Algumas horas em Coubron permitem ver dois fenômenos que podem, se não tirar a vitória de Macron (que tem liderado pesquisas numa proporção de 60% a 40%), fragilizar sua vantagem: o apoio não declarado a Le Pen e a abstenção. SEM VOTAR Nesta terça (2), o movimento França Insubmissa, do derrotado Mélenchon, divulgou resultado de enquete que mostrou que dois terços de seus apoiadores não irão às urnas (o voto é facultativ­o) ou votarão branco ou nulo. Um terço irá de Macron.

A consulta não previu resposta em favor de Le Pen, mas uma outra pesquisa, da OpinionWay, mostra 17% de eleitores de Mélenchon dispostos a apoiar Le Pen. Nos opostos do espectro ideológico, ambos os políticos têm discurso antiestabl­ishment.

Em Coubron, Damien Deville, 40, eleitor de Mélenchon, não vai votar. Admite que é uma escolha perigosa, mas acredita não ser possível Le Pen vencer. O comerciant­e não quer repetir o que fez em 2002 —tal qual a esmagadora maioria dos franceses— quando aceitou reeleger Jacques Chirac, de centro-direita, para barrar Jean-Marie Le Pen, pai da atual candidata.

“Macron é um herdeiro do [presidente François] Hollande, foi ministro dele. Dessa vez quero demonstrar a minha insatisfaç­ão.” VOTO DECLARADO Foi no bar da pequena Coubron que a reportagem encontrou o único apoiador declarado de Marine Le Pen. Curiosamen­te, um imigrante: o turco Uzli Isa.

“Sei que ela não vai ganhar, mas vou votar, é preciso fazer uma limpeza em tudo o que está aí.” Indagado se não temia perseguiçõ­es de populações nascidas no exterior, disse: “Nasci na Turquia, mas estou há 32 anos na França, não estou nem aí. Agora é a hora de controlar mais as coisas”.

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Rodrigo Vizeu/Folhapress Prefeitura da cidade de Coubron, subúrbio rico com 5.000 habitantes a 26 km de Paris

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