Folha de S.Paulo

Clássico colocou Caribe no mapa da literatura e marcou gerações

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DE BUENOS AIRES

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Em uma entrevista ao jornal “The New York Times” no fim de sua gestão, o então presidente dos EUA, Barack Obama, contou que “Cem Anos de Solidão” era um dos livros que ele tinha dado de presente à sua filha Malia. Um de seus antecessor­es, Bill Clinton, era outro fã da obra, além de amigo do autor. Mas não foi sempre assim. “Quando ‘Cem Anos’ surgiu, quem era caribenho, como eu, foi tomado por uma explosão de alegria, pois aquilo falava sobre a nossa vida e com a nossa linguagem. Mas para o resto do mundo era algo exótico. Meus amigos norte-americanos não o entendiam”, conta o porto-riquenho Hector Feliciano, editor de “Gabo, Periodista” (FNPI).

Ele lembra também que até então não se tratava o Caribe como região culturalme­nte particular e que caribenhos de outros países passaram a se sentir identifica­dos.

“Aquele misticismo eu achava que só existia em Porto Rico. Lembro de meus tios do interior chegando para visitar-nos na capital e contando que tinham falado com fantasmas de antepassad­os. Era natural, mas não sabía- mos que isso existia em outras partes do Caribe. E está tudo em ‘Cem Anos’”, conclui.

Para o colombiano Jorge Franco (“Rosario Tijeras”), Gabo foi um grande inspirador de sua geração, mas também limitou outros autores, pela dificuldad­e de saírem debaixo da sombra de “uma figura tão canônica como a de García Márquez”, diz.

Como Feliciano, Franco crê que a obra cative, em especial, pela linguagem e pela forma tão particular como reconstrói a vivência do autor.

Em sua famosa entrevista a Luis Harss, em 1966, Gabo dizia que o que de mais inte- ressante havia em sua vida tinha ocorrido até seus 8 anos de idade. “Depois, tudo me resultou bastante plano.”

“Cem Anos” tem como matéria-prima sua infância em Aracataca, onde foi criado pelos avós, numa casa sempre cheia de gente, parentes, amigos, indígenas entrando e saindo e contando histórias.

Macondo era o nome de uma plantação de bananas, cuja placa leu ainda criança, e a partir dessa mistura construiu o universo de “Cem Anos de Solidão”.

Na obra, Macondo é uma cidade mítica, fundada por pessoas que fugiam de uma guerra (alusão ao constante conflito no país), envolta em pressentim­entos da chegada de catástrofe­s ou pestes, como a da insônia, a primeira a atacar a população.

Na Colômbia, o livro é lido de forma diferente dependendo da região. “Todos a reconhecem como algo colombiano, mas ao mesmo tempo exótico”, conta Franco, que não é da costa, mas de Medellín.

Quando perguntava­m ao próprio autor sobre sua influência na literatura latinoamer­icana, dizia que não tinha tanta ambição. “Eu só queria escrever do jeito que falava a minha avó”, dizia. (SC)

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Ilustração Eduardo Foresti

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